Um estudo de três investigadores da Universidade de Aveiro alerta para um aumento muito preocupante das temperaturas na Península Ibérica. Em Portugal as regiões mais afetadas serão as que já mais sofrem com os incêndios - o interior, na região centro, o Algarve, mas também o Alentejo. David Carvalho, cientista que assina o estudo, insiste numa urgente redução da emissão de gases, como forma de travar essa subida galopante.
Daqui a poucas décadas poderemos ter três meses por ano onde as temperaturas máximas diárias estarão acima de 40 ºC. E esse será um fenómeno "muito menos lento do que se julgava", tal como revela ao DN David Carvalho, coordenador de estudo de três investigadores da Universidade de Aveiro (UA), que acaba de ser publicado revista Climate Dynamics.
As conclusões resultam de um trabalho levado a cabo pela equipa do cientista David Carvalho, integrada pelos investigadores Alfredo Rocha e Susana Cardoso Pereira, todos do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM) da UA. Segundo o estudo, as temperaturas da Península Ibérica vão aumentar de forma "muito preocupante" durante este século. E prevê até 2100 aumentos da temperatura média de dois a três graus ao longo de todo o ano, o suficiente para causar graves impactos no meio ambiente e, por consequência, na saúde pública.
Em Portugal há mesmo regiões que poderão registar aumentos de quatro a cinco graus centígrados nas máximas diárias. É o caso de todo o interior, além do Algarve e Alentejo. Ora, sabendo que é aí que têm vindo a ocorrer fenómenos extremos, degenerando em fogos florestais de grandes e graves dimensões, o alerta surge acompanhado de uma única receita, "que devemos repetir até à exaustão: reduzir as emissões de gases com efeito-estufa", adianta David Carvalho.
Apesar de o estudo observar toda a Península Ibérica, é verdade que "esta tendência é mais predominante no centro-sul de Espanha e não tanto para Portugal", admite o cientista. Porém, "as implicações poderão ser enormes", alerta.
Com base nos aumentos de temperatura detetados no estudo que coordenou, o cientista da UA antevê que "o número de dias por ano com temperaturas máximas acima dos 40 graus centígrados poderão aumentar até cerca de 50 dias por ano no final deste século".
A subida dos termómetros ocorre em todas as linhas, colocando de novo na ribalta o problema das alterações climáticas. O estudo projetou e analisou as temperaturas de superfície na Península Ibérica para dois períodos futuros, o primeiro de 2046 a 2065 e o outro de 2081 a 2100.
Os resultados apontam para aumentos da temperatura diária, não só da média como também da máxima e da mínima, para praticamente todo o território da Península Ibérica. As temperaturas máximas diárias aumentarão mais do que as médias e as mínimas serão as que aumentarão menos.
Existe, no entanto, uma grande variação espacial nestes aumentos de temperatura: para Portugal os aumentos andarão à volta dos 1,5-2 graus centígrados para o período 2046-2065 e de 2-3 graus centígrados para 2081-2100 em termos de temperatura média diária. No caso da temperatura máxima, o aumento poderá chegar aos 4-5 graus centígrados no final do século.
David Carvalho contou ao DN que afunilou a sua área de interesse para este tema há cerca de 10 anos, quando começou o doutoramento. Depois de um período a trabalhar nos Estados Unidos da América, regressou a Portugal e à UA para aprofundar o que já vinha a estudar desde há muito. Entretanto, a equipa que coordena dedicou-se com afinco ao estudo nos últimos cinco meses. "Aumentos de cerca de 2-3 graus centígrados em termos de temperaturas médias, máximas e mínimas são suficientes para causar impactos em áreas vitais como agricultura, fogos florestais, seca, desertificação e respetivos impactos na saúde e bem-estar das pessoas", sublinha, lembrando outro fator, que é motivo de grande preocupação: "a unanimidade quase total nos dados de clima futuro no que diz respeito ao aumento generalizado de temperatura na Península Ibérica, em todas as estações do ano, zonas geográficas e tipo de temperaturas", sejam elas médias, máximas e mínimas.
É urgente reduzir a emissão de gases
"O único caminho a seguir será gastar menos energia e recursos e ao mesmo tempo gerar a energia de que necessitámos sem emissão de gases com efeito de estufa", resume David Carvalho.
Numa nota enviada à imprensa esta quarta-feira, a UA resume os resultados de forma apocalíptica: "aumentos de temperatura vão "assar" a Península Ibérica"". O coordenador do estudo admite que que o termo pode chocar o leitor, mas acredita que "por vezes é preciso que a sociedade leve um abanão, para ver se começa a mudar hábitos, de uma vez por todas, antes que tarde".
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