Avançar para o conteúdo principal

Porque é que ainda taxamos a cilindrada?



 Está na hora de nos livrarmos de velhos paradigmas, como taxar a cilindrada, para podermos mais facilmente aceder a novas e revolucionárias motorizações.


Impostos, taxas e “taxinhas” parecem estar por toda a parte quando o assunto é automóveis. Continua a ser uma das galinhas dos ovos de ouro do nosso Estado, basta ver as previsões do OE 2019 no que toca a receita: mais de 800 milhões de euros para o ISV, quase 400 milhões para o IUC, e mais de 3600 milhões de euros de ISP.


Mas não é minha intenção queixar-me dos impostos que pagamos, ou de propor as bases para uma reforma ou um impactante e sonoro “choque” fiscal.


Ok, é a nossa realidade, temos de pagar impostos, e nem mesmo algumas “borlas” como hipotéticos incentivos para aquisição de automóvel atenuam o facto de que pagamos demasiado — um pequeno aparte, ter incentivos estatais para aquisição de automóveis, sejam de que tipo for, até os “verdes”, é simplesmente absurdo… mas isso são outros “quinhentos”.


O que proponho é, no entanto, a reformulação de como os calculamos, de modo a beneficiar as motorizações que garantem resultados reais no que toca a consumos e emissões, e não penalizá-las pelas suas características físicas.


Porquê a cilindrada?

Taxar a cilindrada ou o tamanho do motor de um automóvel é um resquício de tempos idos. Quantas reportagens ouvimos na televisão reportar sobre viaturas de “alta cilindrada”, como se tratassem de itens de luxo, só acessíveis ao estrato sócio-económico mais elevado, e depois verificamos que não passam de discretas berlinas médias com motores de… dois litros, provavelmente a gasóleo.


Se no passado (já muito distante) até poderia haver uma correlação entre o tamanho do motor, os consumos, ou até o tipo de carro, neste século, com o downsizing e a sobrealimentação, o paradigma mudou, e já está novamente a mudar, com a substituição já ocorrida do lasso NEDC pelo mais rigoroso WLTP.


Se com o downsizing, até podíamos ter alguns benefícios no nosso peculiar sistema fiscal — motores mais pequenos, menos impostos —, a adaptação dos construtores ao WLTP terá como uma das suas consequências o fim da perseguição a cilindradas mais reduzidas, cujos benefícios no mundo real no que toca a consumos (e por arrasto, emissões de CO2), revelaram-se, quanto muito, dúbios.


Um pequeno exemplo é comparar a generalidade dos consumos reais dos pequenos motores turbo com os atmosféricos de “alta cilindrada” da Mazda, o único construtor que não seguiu a via do downsizing e sobrealimentação. O seu motor de 2.0 l naturalmente aspirado de 120 cv consegue consumos equivalentes e até melhores que a generalidade dos três cilindros turbo de 1000 cm3 e potência semelhante — consultem sites como o spritmonitor e façam as vossas comparações.


O nosso ISV simplesmente torna impossível um preço competitivo deste 2.0 contra os 1.0, mesmo que o motor maior possa ser o melhor na obtenção de menores consumos e emissões, em condições reais.


O problema

E este é o problema: estamos a taxar uma motorização pelas suas características físicas e não pelos resultados que gera. A introdução das emissões de CO2 produzidas por um motor no cálculo dos impostos a pagar — já presente no nosso sistema —, por si só, seria quase suficiente para separar o trigo do joio.


Um problema que tende a agravar nos próximos anos, considerando o já referido WLTP e outros fatores, como o facto de a indústria automóvel ser um palco global e haver mercados bem mais importantes para os construtores do que as necessidades deste cantinho à beira mar plantado.


Não significa que os motores irão duplicar de tamanho, mas já  assistimos hoje em dia a pequenos aumentos de capacidade em várias motorizações para melhor lidarem com as normas e protocolos mais exigentes. Até nos Diesel, como vimos na Renault e Mazda, que subiram, este ano, a capacidade dos seus 1.6 e 1.5, em 100 cm3 e 300 cm3, respetivamente, para manter as emissões NOx em níveis legais.


Mas não é um problema que afete apenas e só os amaldiçoados Diesel. Veja-se os híbridos: o Mitsubishi Outlander PHEV, o híbrido plug-in mais vendido na Europa, vem agora com um 2.4 em vez do 2.0; e a Toyota acabou de apresentar um novo 2.0 híbrido, declarando-o o mais eficiente motor a gasolina de sempre. E os motores revolucionários da Mazda e Nissan, nomeadamente o SKYACTIV-X e VC-T? Gigantes de… dois mil centímetros cúbicos.


O nosso sistema fiscal não é nada amigo destes motores, devido ao seu tamanho — deve ser coisa de gente rica, só pode — apesar de prometerem mais eficiência e até menores emissões em condições reais do que os motores pequenos.


Não estará na altura de repensar a forma como taxamos o automóvel?

É fantasioso imaginar o fim do ISV — penalizar o ato da compra do automóvel é absurdo, quando o mal vem do seu uso —, mas talvez seja altura de considerar a reformulação do mesmo, assim como o do IUC, que também recorre a escalões de cilindrada para o seu cálculo.


O paradigma mudou. A cilindrada já não é a referência para definir performance, consumos e emissões. Porque temos de pagar por isso?


https://www.razaoautomovel.com/2018/11/taxar-a-cilindrada-porque

Comentários

Notícias mais vistas:

Foi aprovado a descida de tarifas na mobilidade elétrica

 A Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) desceu as tarifas aplicadas aos comercializadores de eletricidade para mobilidade elétrica e aos operadores de pontos de carregamento em 37,1%, tendo os detentores de pontos de carga uma redução de 61,7%, segundo avançado pela imprensa. Num comunicado, citado pela imprensa, a Mobi.E, Entidade Gestora da rede de Mobilidade Elétrica (EGME) informou que, a partir do dia 1 de janeiro, a tarifa aplicável aos Comercializadores de Eletricidade para a Mobilidade Elétrica (CEME) e aos Operadores de Pontos de carregamento (OPC) vai baixar 37,1%. Por sua vez, os valores a aplicar aos Detentores de Pontos de Carregamento (DPC) "serão reduzidos de forma ainda mais acentuada", em 61,7%. A decisão foi anunciada recentemente pela ERSE. Segundo o comunicado, no próximo ano, "a tarifa EGME a suportar, tanto por CEME como OPC por cada carregamento efetuado na rede nacional de carregamento será de 0,1572 euros, quando, em 2024, o valor ...

Tem ADSE? Reembolsos por consultas vão aumentar em 2025

 Contas da ADSE indicam que estas mudanças têm um valor estimado de “aproximadamente 11,2 milhões de euros anuais”. Tem ADSE? Reembolsos por consultas vão aumentar em 2025 A ADSE avançou com mudanças para dar mais benefícios em 2025, nomeadamente um limite aos custos suportados com cirurgias no regime convencionado, um aumento dos reembolsos pagos pelas consultas no regime livre e a revisão de alguns preços. Segundo um comunicado publicado, esta terça-feira, na página do subsistema de saúde dos funcionários públicos, "estas mudanças refletem o empenho permanente da ADSE I.P. na garantia de acesso a cuidados de saúde mais inovadores, vantajosos e equitativos, mesmo em momentos de maior desafio". A ADSE destaca a redução dos encargos para os beneficiários com estas mudanças, que é "estimado em aproximadamente 11,2 milhões de euros anuais, bem como o aumento médio de 6% nos valores pagos aos prestadores na Tabela do Regime Convencionado". Entre as principais medidas, d...

Governo aprova aumentos salariais para a função pública que fica com base remuneratória nos 878,41 euros em 2025

O ministro da Presidência, António Leitão Amaro, intervém durante o briefing de conclusão após a reunião do Conselho de Ministros, no Campus XXI em Lisboa, 05 de dezembro de 2024, TIAGO PETINGA/LUSA  O Governo aprovou, no Conselho de Ministros desta quarta-feira, os aumentos salariais para a função pública em 2025, que tinham já sido acordados com os sindicatos. O Governo aprovou esta quarta-feira em Conselho de Ministros a atualização salarial para a função pública em 2025. Assim, no âmbito do acordo já concretizado com estruturas sindicais, o salário mínimo na função pública passará para 878,41 euros, face aos 821,83 euros em vigor. Foi ainda aprovado o aumento de, pelo menos, 56,58 euros para vencimentos brutos mensais de até 2.630 euros e de 2,15% para salários superiores. “Um aumento superior ao que estava previsto pelo governo anterior”, salienta António Leitão Amaro, na conferência de imprensa após a reunião do Conselho de Ministros. Foi também aprovado o aumento de 5% nas a...