Avançar para o conteúdo principal

Serve como aviso: Vénus já foi semelhante à Terra e sofreu catástrofe climática


Nos últimos anos, cientistas têm apresentado indícios de que Vênus nem sempre foi um planeta infernal e hostil a qualquer forma de vida. Embora seja o planeta mais quente do Sistema Solar, com ar altamente tóxico, preenchido por nuvens de dióxido de carbono e ácido sulfúrico, cada vez mais pesquisas apontam que ele já teve uma atmosfera muito mais fria e oceanos líquidos em sua superfície. Essa ideia foi reforçada por uma simulação apresentada nesta semana, mas também ganhou algumas perguntas ainda sem respostas.

Embora muitos pesquisadores acreditem que Vênus está fora da zona habitável do nosso Sistema Solar e muito perto do Sol para sustentar a água líquida, o novo estudo sugere o contrário. “Vênus atualmente tem quase o dobro da radiação solar que temos na Terra”, disse Michael Way, coautor do novo estudo. “No entanto, em todos os cenários que modelamos, descobrimos que Vênus ainda poderia suportar temperaturas de superfície favoráveis à água líquida”, garantiu.

De acordo com as simulações apresentadas em uma conferência de ciência planetária na Suíça, Vênus poderia ter aproveitado em sua "juventude" algumas condições iniciais adequadas para se proteger da luz solar, graças às camadas de nuvens, criando um ambiente agradável e úmido por bilhões de anos. Nesse cenário, Vênus pode ter sido o primeiro planeta habitável do Sistema Solar - até que alguma catástrofe o sufocou em dióxido de carbono. "Se havia vida em Vênus, eles tinham apenas uma casa", diz Colin Goldblatt, cientista planetário da Universidade de Victoria, no Canadá, "e essa casa não é mais muito boa".

Uma breve história de Vênus

Aqui na Terra, o que mantém o planeta vivo é o ciclo que preserva a diferença de temperatura entre a crosta fria e o núcleo quente, o que ajuda a manter a maior parte do carbono do planeta preso em materiais rochosos no subsolo. Vênus não conseguiu conservar esse ciclo, e hoje sua atmosfera transborda dióxido de carbono. O grande mistério que desafia os cientistas é o porquê. Tradicionalmente, acredita-se que o Sol evaporou rapidamente os oceanos do planeta, enviando esse vapor para o alto, onde se formou uma atmosfera densa que prendeu no planeta todo o calor recebido.

Eventualmente, a superfície ficou tão quente quanto o núcleo, o que acabou com os terremotos e outras atividades tectônicas que antes ajudaram Vênus a manter o equilíbrio. Sem o sistema tectônico, a crosta se tornou como “uma tampa rígida que apenas acumula calor e pressão por dentro até o planeta inteiro colapsar”, disse Anthony Del Genio, pesquisador do Instituto Goddard de Estudos Espaciais da NASA e co-autor da pesquisa recente. Isso teria acontecido apenas algumas centenas de milhões de anos atrás. Vulcões explodiram por todo o planeta, inundando a atmosfera com dióxido de carbono, e o resultado foi a transformação do planeta na rocha sem vida que vemos hoje.

Outra história (incompleta) de Vênus
Mas essa é a interpretação mais tradicional. A simulação da equipe de Del Genio mostra que essa história "não se sustenta". O trabalho considerou cinco versões diferentes de possíveis Vênus iniciais, e levanta outra possibilidade: se o jovem planeta Vênus tivesse água abundante como a jovem Terra, e se as marés ou colisões com corpos próximos desaceleraram sua rotação mais cedo, aquele mundo teria desenvolvido nuvens - o que teria mudado tudo. Elas teriam feito a luz solar voltar ao espaço, interrompendo o processo de aquecimento, mantendo seus oceanos frios por talvez bilhões de anos. As placas tectônicas continuariam deslizando, e o carbono seria mantido no subsolo.

Ainda não podemos confirmar essas possibilidades por falta de missões em Vênus, mas se futuramente enviarmos sondas capazes de confirmar as suposições sobre a água e a rotação, os cientistas precisarão encontrar uma nova explicação para responder o que levou Vênus ao colapso. "Precisamos de mais missões para estudar Vênus e obter uma compreensão mais detalhada de sua história e evolução", disse Way. "No entanto, nossos modelos mostram que existe uma possibilidade real de que Vênus possa ter sido habitável e radicalmente diferente de Vênus que vemos hoje. Isso abre todos os tipos de implicações para os exoplanetas encontrados na chamada ‘Zona Vênus’, que pode de fato hospedar água líquida e climas temperados".

Um alerta que mora ao lado

Seria Vênus um retrato do futuro da Terra?
Se Vênus pode ter sido semelhante à Terra no passado, não há razão para acharmos que a Terra não se tornará semelhante a Vênus no futuro. Quando ouvimos falar que um planeta morreu após um derramamento de dióxido de carbono, é impossível deixar de pensar pensar na crise climática, pois desenterrar e queimar combustíveis fósseis é praticamente o que os vulcões venusianos fizeram.

Há dois lados nesse alerta. O mais positivo é que, para desencadear o tipo de apocalipse venusiano, a humanidade teria que trabalhar muito para queimar todas as moléculas de combustível fóssil disponíveis, aumentando a concentração de dióxido de carbono na atmosfera. Pelo outro lado, Goldblatt, avisa que "depende do entusiasmo que tivermos com os novos combustíveis fósseis". De acordo com seu estudo anterior sobre o efeito estufa, a atividade humana provavelmente seria insuficiente para nos levar a esse ponto de não retorno, mas isso não significa que isso nunca possa acontecer. "Não estou dizendo que é fácil", diz Goldblatt, "mas não é impossível".

Para micróbios e baratas, há pouco risco de extinção nesse cenário, já que a humanidade provavelmente não pode destruir permanentemente a capacidade da Terra de irradiar o excesso de calor. Mas para nós, humanos, os limites para uma extinção em massa são bem mais estreitos.


Nosso vizinho em seu estado infernal serve como um lembrete de que não há garantias cósmicas. Se quisermos algum grau de estabilidade, teremos que nos esforçar mais para parar de testar os limites da Terra. "Um planeta como o nosso pode dar errado", diz Goldblatt. "É a lição final por que, como espécie dominante globalmente, temos que cuidar do nosso planeta".

https://canaltech.com.br/espaco/serve-como-aviso-venus-ja-foi-semelhante-a-terra-e-sofreu-catastrofe-climatica-150885/

Comentários

Notícias mais vistas:

EUA criticam prisão domiciliária de Bolsonaro e ameaçam responsabilizar envolvidos

 Numa ação imediatamente condenada pelos Estados Unidos, um juiz do Supremo Tribunal do Brasil ordenou a prisão domiciliária de Jair Bolsonaro por violação das "medidas preventivas" impostas antes do seu julgamento por uma alegada tentativa de golpe de Estado. Os EUA afirmam que o juiz está a tentar "silenciar a oposição", uma vez que o ex-presidente é acusado de violar a proibição imposta por receios de que possa fugir antes de se sentar no banco dos réus. Numa nota divulgada nas redes sociais, o Escritório para Assuntos do Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado dos Estados Unidos recorda que, apesar do juiz Alexandre de Morais "já ter sido sancionado pelos Estados Unidos por violações de direitos humanos, continua a usar as instituições brasileiras para silenciar a oposição e ameaçar a democracia". Os Estados Unidos consideram que "impor ainda mais restrições à capacidade de Jair Bolsonaro de se defender publicamente não é um serviço público...

Supercarregadores portugueses surpreendem mercado com 600 kW e mais tecnologia

 Uma jovem empresa portuguesa surpreendeu o mercado mundial de carregadores rápidos para veículos eléctricos. De uma assentada, oferece potência nunca vista, até 600 kW, e tecnologias inovadoras. O nome i-charging pode não dizer nada a muita gente, mas no mundo dos carregadores rápidos para veículos eléctricos, esta jovem empresa portuguesa é a nova referência do sector. Nasceu somente em 2019, mas isso não a impede de já ter lançado no mercado em Março uma gama completa de sistemas de recarga para veículos eléctricos em corrente alterna (AC), de baixa potência, e de ter apresentado agora uma família de carregadores em corrente contínua (DC) para carga rápida com as potências mais elevadas do mercado. Há cerca de 20 fabricantes na Europa de carregadores rápidos, pelo que a estratégia para nos impormos passou por oferecermos um produto disruptivo e que se diferenciasse dos restantes, não pelo preço, mas pelo conteúdo”, explicou ao Observador Pedro Moreira da Silva, CEO da i-charging...

Aníbal Cavaco Silva

Diogo agostinho  Num país que está sem rumo, sem visão e sem estratégia, é bom recordar quem já teve essa capacidade aliada a outra, que não se consegue adquirir, a liderança. Com uma pandemia às costas, e um país político-mediático entretido a debater linhas vermelhas, o que vemos são medidas sem grande coerência e um rumo nada perceptível. No meio do caos, importa relembrar Aníbal Cavaco Silva. O político mais bem-sucedido eleitoralmente no Portugal democrático. Quatro vezes com mais de 50% dos votos, em tempos de poucas preocupações com a abstenção, deve querer dizer algo, apesar de hoje não ser muito popular elogiar Cavaco Silva. Penso que é, sem dúvida, um dos grandes nomes da nossa Democracia. Nem sempre concordei com tudo. É assim a vida, é quase impossível fazer tudo bem. Penso que tem responsabilidade na ascensão de António Guterres e José Sócrates ao cargo de Primeiro-Ministro, com enormes prejuízos económicos, financeiros e políticos para o país. Mas isso são outras ques...