Vendida a uma associação que representa Google, Meta, Microsoft, Spotify ou Sony, a tecnologia criada no INESC TEC promete “revolucionar” os smartwatches e mexer com a indústria eletrónica.
Chama-se C4MiR – Módulo de Controlo para Adaptação de Barramento de Comunicação ao Teste e Diagnóstico de Redes de Sensores, promete tornar os relógios e as pulseiras inteligentes (smartwatches e smartbands) mais rápidos e fiáveis, e é a primeira tecnologia desenvolvida pelo Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Tecnologia e Ciência (INESC TEC) a ter a patente comercializada a nível internacional.
Segundo adiantou ao ECO o responsável pelo serviço de apoio ao licenciamento deste instituto de investigação ligado à Universidade do Porto, a compradora foi a Allied Security Trust (AST), sediada nos EUA, que deve agora ceder os direitos de utilização às suas associadas, entre as quais estão algumas das maiores empresas de tecnologia do mundo, como a Google, Meta, Microsoft, Spotify, Phillips ou Sony.
A venda em si demorou meses e foi relativamente simples. A grande dificuldade é encontrar e convencer o possível comprador de que o investimento na tecnologia é um bom negócio.
Daniel Marques Vasconcelos, Responsável pelo serviço de apoio ao licenciamento do INESC TEC
Sem confirmar os valores envolvidos nesta operação, alegando ser uma informação confidencial, Daniel Marques Vasconcelos detalhou que o “processo de valorização económica” foi iniciado a par daquele relativo à proteção, isto é, o depósito de pedido de patente inicial. “A venda em si demorou meses e foi relativamente simples. A grande dificuldade é encontrar e convencer o possível comprador de que o investimento na tecnologia é um bom negócio”, acrescentou.
A família de patentes vendida era propriedade exclusiva do INESC TEC e da Universidade do Porto. Quem foram os coinventores desta família de patentes? António José Salazar, estudante de doutoramento à data do início do desenvolvimento, em 2014; e dois investigadores do INESC TEC e professores da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP): José Machado da Silva e Miguel Velhote Correia.
“Revolucionar” o mercado dos weareables
Sejam relógios, pulseiras ou óculos de realidade virtual, os wearables dispõem de um grande número de sensores que medem com precisão dados como a velocidade e a distância de uma corrida, a frequência cardíaca, as calorias gastas ou as horas de sono. Porém, estes componentes eletrónicos tendem a sofrer desgaste associado à utilização e aos esforços a que são sujeitos durante o uso, o que leva a desvios de calibração e danos que comprometem a fiabilidade e funcionalidade.
Ora, antecipando um “forte impacto na indústria eletrónica”, os criadores argumentam que esta tecnologia portuguesa vem permitir o autodiagnóstico de falhas nos vários sensores que integram estes dispositivos, como o mau contacto dos elétrodos com a pele ou a degradação dos circuitos, aumentando a fiabilidade e a facilidade de calibração e manutenção deste tipo de produtos em ambientes diversos e onde não existem profissionais para verificar e reparar eventuais anomalias.
Miguel Velhote Correia, investigador do INESC TEC e docente da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP)
O cocriador Miguel Velhote Correia assegura que “o C4MiR está pronto para ser incorporado no desenvolvimento de novos produtos e serviços, promovendo a mudança no mercado de tecnologia, com impacto direto na vida das pessoas, que terão acesso a dispositivos mais confiáveis, inteligentes e acessíveis”. Além disso, esta tecnologia pode também ser usada durante as fases finais do fabrico dos circuitos eletrónicos, reduzindo o tempo e o custo das operações de teste.
O C4MiR está pronto para ser incorporado no desenvolvimento de novos produtos e serviços, promovendo a mudança no mercado de tecnologia.
Neste tipo de processos é raro haver uma venda de patentes, acontecendo normalmente a transferência de tecnologia por via de spin-offs, licenciamento do uso ou por investigação sob contrato com empresas. O relatório mais recente publicado pela Associação Europeia de Profissionais de Transferência de Tecnologia (ASTP) mostra que a maioria dos gabinetes de transferência de tecnologia europeus (64%) reportou não ter realizado qualquer venda de patentes no ano passado.
Para o INESC TEC, esta é mesmo a primeira venda de uma patente, o que “vem mostrar que este também é um caminho possível, embora raro”. “A transferência de tecnologia não é um processo chave-na-mão. Por muito boa que seja a tecnologia que um instituto de investigação e desenvolvimento (I&D) ou Universidade desenvolvam, a empresa que a decida comprar dificilmente terá toda a informação que necessita para desenvolver produtos e serviços que tenham a tecnologia como base”, sustentou Daniel Marques Vasconcelos.
O responsável pelo serviço de apoio ao licenciamento do instituto de investigação portuense, que esteve envolvido no desenvolvimento da app StayAway Covid, sublinhou que “há sempre conhecimento associado que é crítico e de difícil transmissão”, o que, sentenciou, aponta para a “importância das relações de confiança e de médio e longo prazo para a transferência de tecnologia de forma sistemática entre academia e indústria”.
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