Amigo de António Costa diz que "Devia ser enforcado quem fez contrato do Novo Banco com Lone Star" sem se dar de conta que o responsável foi o próprio amigo António Costa e Mário Centeno.
O presidente do Promovalor e presidente do Benfica está a ser ouvido no Parlamento, onde garantiu que cumpriu "com tudo" o que lhe foi pedido. "Entreguei todos os ativos, não tive qualquer perdão de juros ou de capital."
Vieira diz que não foge e promete pagar ao Novo Banco
O presidente da Promovalor, Luís Filipe Vieira, afirmou esta tarde - naquela que é porventura a declaração mais polémica no depoimento que está a fazer na Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco - que "devia ser enforcado" quem fez o contrato de venda do Novo Banco à Lone Star.
Respondendo à deputada Filipa Roseta, do PSD, Vieira disse: "Quem assinou esse contrato, pendurem-no". Depois de no PSD lhe recordarem que, pelo Governo, o contrato foi assinado pelo então ministro das Finanças, Mário Centeno, acrescentou: "Devia ser enforcado, uma pessoa que assina uma coisa destas.... Não se podem fazer...", afirmou.
Antes a deputada tinha questionado o empresário (questionado nesta comissão nessa condição e não como presidente do Benfica) sobre a desvalorização abrupta de vários dos ativos associados às suas empresas, designadamente entre 2017 e 2018.
E Vieira respondeu: "Eu, sobre avaliações, digo quem as faz são peritos mas nunca incluem normalmente o desenvolvimento do projeto". Acrescentando que "não faz sentido alguém fazer avaliações destas, talvez as façam para o fundo" e que alguns desses avaliadores "não percebem nada de construção".
Depois, Vieira considerou ainda que José António dos Santos, empresário conhecido como 'rei dos frangos', "fez um ótimo negócio" recomprando dívida ao fundo Davidson Kempner que lhe tinha pertencido, por um preço mais alto.
Questionado pela deputada Mariana Mortágua (BE) acerca de um fundo que tinha recomprado a dívida da Imosteps, garantida pelas empresas de Luís Filipe Vieira, o também presidente do Benfica disse que a pessoa que financiou a operação foi o empresário José António dos Santos, acionista da Valouro.
"Vivo bem"
Antes, Vieira tinha assegurado que vive "bem", sublinhando aliás que recentemente a sua conta foi reforçada com cerca de dois milhões de euros recebidos do fisco.
"Do que eu vivo? Tenho outros negócios, tenho uma boa reforma. Vivo bem. Por acaso ainda agora veio uma coisa curiosa. Ainda foi reforçada a conta com dois milhões e tal de euros que eu recebi do fisco", respondeu, durante o período de inquirição da deputada do BE Mariana Mortágua.
Questionado pela deputada bloquista sobre se tinha rendimentos para além das empresas que são conhecidas e que "foram dadas como penhor e que estão em insolvência", o presidente da Promovalor disse que tinha "algumas sociedades com outras pessoas" e deu o exemplo de um que se for vendida brevemente lhe dará "à volta de 2 milhões e meio de euros".
"Em 2018 tinha uma exposição total, se excluirmos o fundo que vendeu ao BES, de cerca de 380 milhões de euros. Já aqui disse que deu um aval pessoal para várias das suas dívidas, que nunca ninguém executou. Temos um parecer interno de 2019 em que nos diz que o único bem em seu nome é uma casa para palheiro", questionou, no arranque da audição, Mariana Mortágua.
Luís Filipe Vieira negou de imediato e assegurou que nunca o tentaram executar, tendo a deputada do BE insistido para saber qual o património que "está por trás desse aval que deu".
Depois de uma longa conversa com o seu advogado - como tem acontecido ao longo desta audição por diversas vezes -, o presidente da Promovalor disse: "eu neste momento não estou em incumprimento com o BES nem com ninguém. No dia em que eu tiver que chegar a alguma situação com o BES, logicamente que eu tenho que cumprir com aquilo que está acordado".
Luís Filipe Vieira deixou claro, depois da insistência de Mariana Mortágua, que tem mais património do que essa "casa para palheiro" referida. "Nem moro aí nem nunca morei aí nem sei o que é isso tão pouco", atirou, não vendo "qual é a necessidade" de dizer "o seu património neste momento".
O presidente da Promovalor fez ainda questão de explicar porque foi convidado a depor na comissão: "Eu tenho a noção exata que estou aqui porque sou presidente do Benfica, senão não estava cá, tenho essa noção exata. Bastou ver o aparato que eu vi todo hoje, comunicação social... tenho a certeza", disse.
"O senhor não está aqui por causa do Benfica. Relativamente a nós, não está aqui por causa do Benfica", respondeu-lhe o presidente da comissão, Fernando Negrão (PSD).
"O pior erro de gestão"
Antes, Vieira tinha afirmado que a venda de um fundo imobiliário à seguradora BES Vida tinha sido "o pior erro de gestão" da sua vida.
"Isso tem a ver com a dificuldade com a Troika, ou o que era, nós fizemos esse empréstimo obrigacionista de 160 milhões de euros em 2011, e passado um ano chamaram-me do banco que gostariam de adquirir determinados ativos que nós tínhamos. Se me pergunta hoje se fiz mal, fiz mal. Mas também por respeito, que o dinheiro era deles e não podia dizer que não", afirmou esta tarde na Assembleia da República (AR).
"Um dos ativos, hoje, se calhar só a Matinha [em Lisboa] pagaria todo o meu endividamento e sobrava dinheiro. Foi o pior erro de gestão que fiz. Mas quando temos uma relação comercial com o banco, não vale a pena criarmos um contravapor, quando eles dizem que há uma necessidade deles próprios fazerem a operação", referiu.
Luís Filipe Vieira disse que a operação teve "uma pequena rentabilidade" para o seu grupo, dizendo que antes da venda tinha "o melhor património imobiliário de Lisboa", ainda que "com o dinheiro do banco".
O empresário detalhou que o fundo era detido em 55% do capital pelo Grupo Espírito Santo e em 45% pela Promovalor, tendo Luís Filipe Vieira dito que o seu grupo não apresentava dificuldades nessa data.
Acerca dos VMOCs (Valores Mobiliários Obrigatoriamente Convertíveis), Vieira disse que "foi uma maneira de contornar uma situação de determinados empreendimentos que tinha de lançar mais rápido".
Os VMOCs "devem estar a vencer, se não for este ano é para o próximo", segundo Luís Filipe Vieira, acrescentando que "está feito um acordo de reestruturação" no fundo que adquiriu os seus créditos junto do Novo Banco.
"É em 2022 e acho que vai ser prolongado por causa da pandemia", referiu.
"Os VMOCS são muito simples. Nós tínhamos uns ativos que queríamos desenvolver, havia uma opinião de desenvolvermos faseadamente, e tivemos uma hipótese de fazermos mais rapidamente", ascendendo a um total de 160 milhões de euros.
Relação com Salgado "completamente transparente"
Questionado se esse montante ficou registado nas imparidades do Novo Banco, Luís Filipe Vieira respondeu não saber "o que é isso de imparidades".
Antes tinha dito que a relação que tinha com o Banco Espírito Santo (BES) e Ricardo Salgado sempre foi "completamente transparente", tendo sido fomentada aquando da construção do novo estádio da Luz.
"A relação especial que eu tinha com o grupo BES era uma relação completamente transparente, já vinha do passado, de perto deles, mas curiosamente não era com ele [Ricardo Salgado] que eu lidava", disse o também presidente do Benfica no parlamento.
"Houve uma aproximação mais de perto quando foi o financiamento do estádio da Luz. Por isso, os financiamentos que poderiam passar pelo Banco Espírito Santo eram os nossos operacionais, era o nosso diretor financeiro ou era com o Bernardo Espírito Santo ou com o António Souto que eram discutidos, e com o doutor Vítor Madureira, e depois era aprovado em conselho", respondeu ao parlamentar do PSD.
Questionado se se tinha reunido com o antigo líder do BES, Ricardo Salgado, "para discutir os seus negócios particulares e o financiamento às suas empresas", o empresário admitiu que sim.
"Se me perguntar se eu, por vezes, num jantar ou num almoço em que fosse convidado para estar, se falava como é que estavam os negócios, como é que iam ou não iam, logicamente que falava com ele", reconheceu.
"Mas isso não tem nada a ver com a parte da empresa e como é que ela funcionava", referiu o também presidente do Benfica.
"Cumpri com tudo o que me foi pedido"
Antes tinha afirmado que "é cómodo" mas falso que o "colem" às perdas do Novo Banco imputadas aos contribuintes, afirmando que nunca teve nenhum perdão de capital ou juros.
"Por muito que seja cómodo publicamente colarem-me às perdas do Novo Banco e às perdas dos contribuintes portugueses, tudo isso não passa de uma tentativa de alterar a realidade: não tive nenhum perdão de capital, nem nenhum perdão de juros. Nem eu, Luís Filipe Vieira, nem o grupo Promovalor", disse.
"Não pedi perdões de dívida, nem perdão de juros, nem eles me foram dados. É do conhecimento público que muitos empresários tiveram perdões de capital e de juros. Não foi o meu caso", reiterou.
O presidente da Promovalor considerou ainda que "é muito fácil colocar o Luís Filipe Vieira como um grande devedor que não cumpriu" e "muito cómodo para muito boa gente colocar o presidente do Benfica como grande devedor da banca que não cumpriu".
Considerou que isso é cómodo "para os poderes políticos", para "a supervisão bancária" e "para uma certa sociedade que precisa de encontrar culpados".
"Cumpri com tudo o que me foi pedido. E mais: entreguei todos os ativos, não tive qualquer perdão de juros ou de capital, mantive o meu aval pessoal e ainda investi mais capital para ajudar na recuperação", afirmou.
"Digam uma, uma só, operação de reestruturação feita neste país com condições tão ou mais vantajosas para os bancos", acrescentou.
Recuando ao início do seu grupo empresarial, Luís Filipe Vieira disse que criou a Inland/Promovalor com 35 milhões de euros em capitais próprios.
"Não foi dinheiro dos bancos, foi património pessoal e das minhas empresas, fruto do meu trabalho e do trabalho de todos aqueles que me apoiaram nos mais de 30 anos que já levava como empresário", disse aos deputados.
Ao longo do seu percurso, Luís Filipe Vieira referiu que continuou a contar com o apoio das instituições financeiras, e não "por ser presidente do Sport Lisboa e Benfica", mas "naturalmente porque os projetos que eram apresentados mereciam uma análise positiva por parte do sistema bancário".
Segundo Luís Filipe Vieira, em 2011 o ativo do grupo Promovalor ultrapassava os 754 milhões de euros, e entre 2006 e 2017 pagou mais de 161 milhões de euros em encargos financeiros ao Novo Banco.
"Não houve nenhum perdão, não houve nenhum facilitismo para com o Grupo Promovalor", defendeu perante os deputados, acrescentando que não gastou nenhum dinheiro dos financiamentos obtidos "nem em iates, nem em aviões, nem em mordomias".
"Não desviei esse dinheiro para contas pessoais, seja aqui em Portugal ou em qualquer outra parte do mundo", disse, acrescentando que o dinheiro foi aplicado nos projetos imobiliários das suas empresas.
Com a queda do BES, em 2014, a Promovalor "procurou encontrar uma forma de cumprir com as suas obrigações, em particular com o Novo Banco", de acordo com Luís Filipe Vieira.
Aí, as soluções encontradas "mereceram o acompanhamento e a autorização das entidades de supervisão do Novo Banco, nomeadamente do Fundo de Resolução", que tem sido chamado a cobrir as perdas do banco liderado por António Ramalho, com recurso a empréstimos do Tesouro público.
No decurso do trabalho, em 2017 a Promovalor "procedeu à entrega dos seus ativos para pagamento integral das suas dívidas", referiu Luís Filipe Vieira.
Dívida da Promovalor em 2017 era de 227 milhões de euros
Luís Filipe Vieira disse ainda que a dívida da empresa ao Novo Banco ascendia aos 227,3 milhões de euros em 2017, transferindo o seu património para um fundo que a reestruturou.
"Em setembro de 2017, a dívida do Grupo Promovalor ao Novo Banco ascendia a 227,3 milhões de euros", dos quais 217 milhões referentes a capital, 8,9 milhões a juros e 1,4 milhões a comissões bancárias, disse Luís Filipe Vieira.
O também presidente do Benfica referiu ainda que "estes valores não incluem os empréstimos obrigacionistas, que ainda não se venceram, e cujo capital ascende a 160 milhões de euros".
Segundo Luís Filipe Vieira, este empréstimo tem pagamento "assegurado", devido ao "desenvolvimento imobiliário dos ativos da Promovalor entregues ao fundo".
O fundo em causa denomina-se Fundo de Investimento Alternativo Especializado, foi criado em novembro de 2017, e os seus ativos - adquiridos à Promovalor - são geridos pela C2 Capital Partners, uma empresa do gestor e antigo vice-presidente do Benfica Nuno Gaioso Ribeiro.
Segundo o gestor, foram "adquiridos ao Novo Banco 133,9 milhões de euros de créditos" e também "reestruturados pelo Novo Banco (isto é, mantiveram-se no balanço do banco) financiamentos existentes de 85,8 milhões de euros, perfazendo a operação o montante total de 219,7 milhões de euros".
Esta tarde, no Parlamento, Luís Filipe Vieira disse que em face do plano de negócios aprovado junto do Novo Banco, o desenvolvimento imobiliário dos ativos garante a realização de "dividendos que pagam a dívida assumida pelo fundo" e ainda "distribuições remanescentes capazes de liquidar o referido empréstimo obrigacionista tomado pelo então BES".
"O banco está sempre garantido com o controlo total desses dividendos, uma vez que as obrigações são convertíveis em capital da Promovalor", de acordo com Luís Filipe Vieira, que refere que o fundo "recebeu a totalidade do património para pagamento da dívida e juros e liquidação do referido empréstimo obrigacionista".
Desta forma, o Novo Banco "recebeu tudo o que era preciso para liquidar o que restava em termos de dívida". "Eu, Luís Filipe Vieira, saldei tudo o que me foi solicitado, ainda que mantivesse as minhas garantias pessoais", disse, explicando depois que 133,9 milhões de euros foram convertidos em unidades de participação no fundo, que este assumiu 85,9 milhões de euros em dívida, que a Promovalor ficou a dever 7,5 milhões de euros, e que os acionistas da empresa, incluindo o próprio presidente, entregaram cinco milhões de euros para o capital do fundo.
"A Promovalor, para além da entrega do património que estava hipotecado e que resultou do investimento com base nos empréstimos que contraiu, entregou património ao Fundo que não estava onerado, que não estava hipotecado", vincou Luís Filipe Vieira. Desta forma, segundo o presidente do Benfica, "não se projeta qualquer perda para o Novo Banco, logo para os contribuintes".
Luís Filipe Vieira também salientou que não controla o fundo, sendo este controlado pelo Novo Banco, e mesmo que anteriormente o seu filho, Tiago Vieira, estivesse envolvido na C2 Capital Partners, o Novo Banco exigiu a sua saída da sociedade gestora dos ativos.
"Quero sublinhar que a intervenção da Promovalor neste Fundo está limitada a um representante no Comité de Investimento, sem poder vinculativo, como antes referi, e à presença na assembleia de participantes", concluiu o presidente da empresa.
Audiência foi adiada devido a uma consulta médica
No dia 22 de abril, o presidente da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução, Fernando Negrão (PSD), revelou que Luís Filipe Vieira tinha pedido que "a audição fosse adiada para uma data posterior a uma consulta" que tinha marcada.
De acordo com dois relatórios de auditoria da PwC e da EY posteriores à resolução do BES que analisaram as exposições a grandes devedores, a Promovalor devia 304 e 487 milhões de euros, respetivamente, sendo a diferença atribuível ao perímetro de análise dos grupos.
No âmbito da comissão de inquérito, e relacionado com a dívida da Promovalor ao Novo Banco, já foi ouvido Nuno Gaioso Ribeiro, gestor da C2 Capital Partners, empresa que comprou créditos em dívida da empresa de Vieira ao Novo Banco.
Para a gestão da dívida da empresa do presidente do Benfica foi constituído um fundo denominado Fundo de Investimento Alternativo Especializado em novembro de 2017, tendo sido "adquiridos ao Novo Banco 133,9 milhões de euros de créditos" e também "reestruturados pelo Novo Banco (isto é, mantiveram-se no balanço do banco) financiamentos existentes de 85,8 milhões de euros, perfazendo a operação o montante total de 219,7 milhões de euros", segundo o gestor.
Nuno Gaioso Ribeiro, que coincidiu com Luís Filipe Vieira durante oito anos (2012 a 2020) na direção do Benfica e da Benfica SAD como vice-presidente e administrador, respetivamente, rejeitou a existência de um "canal de influência" no clube para reestruturar a dívida da Promovalor, empresa do presidente benfiquista.
"Quando o senhor deputado diz ou insinua que continua a haver e que existia um canal de influência, isso é absolutamente falso e insultuoso para a minha parte. O senhor deputado não pode imaginar que pessoas que integram a direção do Benfica, não remuneradamente, mantendo uma vida profissional" passam a "violar os seus deveres profissionais", respondeu Nuno Gaioso Ribeiro ao deputado do PS João Paulo Correia no dia 27 de abril.
Apelidando de "conversa de café" a possibilidade de existir qualquer conflito de interesses, Nuno Gaioso Ribeiro reconheceu, no entanto, que o facto de a Promovalor conhecer os serviços da sua empresa "pode ter sido importante para o devedor e isso pode ter dado tranquilidade".
Questionado pela deputada Mariana Mortágua (BE) sobre se alguma vez tinha discutido "os negócios da Capital Criativo [anterior designação da C2 Capital Partners] com Luís Filipe Vieira", Gaioso Ribeiro negou.
Nuno Gaioso Ribeiro disse também desconhecer "o histórico de financiamento entre o Novo Banco e o devedor", e que a C2 Capital Partners "nunca teve qualquer participação acionista ou intervenção na gestão da sociedade devedora", a Promovalor.
Nuno Gaioso Ribeiro afirmou ainda que "têm existido dificuldades operacionais no fundo que podem comprometer, nesta conjuntura inesperada e no curto prazo, alguns objetivos previstos atingir ao fim de cinco anos", decorrentes da demora da inclusão de ativos no fundo e outras relacionadas com "litígios complexos", dificuldades "muito agravadas, por fim, pela pandemia".
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