Alfredo Casimiro nasceu em Odivelas com poucos recursos. Virou-se para o trabalho, criou a Urbanos e enriqueceu. Mas nem tudo corre bem nos negócios.
Alfredo Casimiro, presidente do conselho da administração da Groundforce. © Alfredo Casimiro/Facebook
"Tu não tens jeito para nada". O que parecia a sentença de um precetor transformou-se numa força para Alfredo Casimiro. Nascido em 1966, começou a vender logo aos cinco anos, em Odivelas, mas nunca esqueceu as origens humildes dos pais, de Cabanas de Torres, concelho de Alenquer. A Urbanos nasceu em 1990 e com ela Alfredo Casimiro acumulou riqueza. Entrou na Groundforce em 2012, através da Pasogal, e tentou concorrer à privatização dos CTT, mas os últimos anos revelaram-se problemáticos para os negócios.
A pandemia e a redução drástica do tráfego aéreo colocou a Groundforce em dificuldades, trazendo para a luz da ribalta o empresário, e não pelas melhores razões. Na negociação com o governo de um empréstimo de 30 milhões de euro para salvar a empresa, que exigia que as ações da empresa fossem dadas como garantia, Alfredo Casimiro omitiu que os títulos já estavam penhorados por uma instituição bancária. A divulgação da gravação de uma conversa privada entre ele o ministro Pedro Nuno Santos, foi mais uma acha para a fogueira.
"É uma pessoa que não vai para as coisas a brincar. É sério e não se tornou irresponsável de um dia para o outro", conta ao DN/Dinheiro Vivo o ex-presidente da junta de freguesia de Cabanas de Torres. João Ganchas é um dos poucos que aceita falar sobre o empresário que sempre se habituou a passar por esta aldeia dos moinhos, onde o sossego paira ainda mais em tempo de pandemia.
Apesar desta ligação à aldeia, Alfredo Casimiro nasceu e cresceu em Odivelas. O primeiro negócio foi aos cinco anos. "Cultivámos feijão verde, tomate, cebola, alho; todos os produtos hortícolas normais, para não termos de gastar dinheiro na praça. Quando tínhamos excesso de legumes, que não consumíamos inteiramente, vendíamos as sobras. Achavam-me graça e eu tinha habilidade para falar com as pessoas. O dinheiro era muito esticado para que não chegássemos ao final do mês sem dinheiro", contou ao jornal Público em 2010.
Enquanto o futuro empresário aprofundava a ligação com as Testemunhas de Jeová - que largaria mais tarde -, crescia o amor pelos livros. A "paixão por encontrar novos mundos" através dos textos levou a um novo negócio, por volta dos 11 anos. Depois de ler, o pré-adolescente vendia livros ao pé da paragem do então autocarro 36, também em Odivelas, contou em 2012 num documentário exibido pela RTP.
Cabanas de Torres continuava a ser ponto de passagem para Alfredo Casimiro. Também é lá que encontramos Celeste, que se recorda de vários gestos. "Foi ele quem pagou as despesas para que a casa mortuária ficasse completa. Também foi o António Alfredo Casimiro - assim é conhecido na aldeia - que ajudou várias pessoas que passavam dificuldades", destaca esta residente.
Outubro de 1980 foi a data da entrada na Casa Pia, como aluno externo, para os cursos técnico-profissionais. Depois de ter corrido todas as oficinas no primeiro ano, a eletrónica foi a vocação. "Foi lá que aprendi os valores de honra, respeito, amizade, solidariedade, trabalho, disciplina e método".
Acumulou saber social com capacidades técnicas. O dia começava às cinco da manhã e só acabava pelas 21h, depois da viagem de autocarro entre Odivelas e Belém. Os fins de semana e as férias serviam para amealhar mais algum dinheiro, a montar equipamentos de som em bailes na capital.
O gosto pela eletrónica compensou: à beira dos 18 anos, assinou o primeiro contrato de trabalho: 75 contos de ordenado base, a trabalhar para a Control Data, em Palmela. Era mais do triplo do que o pai ganhava enquanto motorista na Carris. Meio ano depois, Alfredo voltou para Lisboa: a pensar no médio prazo, fez um estágio de um ano e reduziu o ordenado para 25 contos para se especializar em informática.
O final da década de 1980 foi transformador: chegou a hora do serviço militar obrigatório, numa altura em que já ganhava 100 contos por mês. Contrariado, Alfredo foi para a secção de transportes. Mal sabia que estava prestes a traçar o seu próprio sucesso: "quando saí da tropa trazia um know how precioso: sabia como é que funciona uma frota de camiões, quais são os custos, onde é que se tira vantagem, como é que se faz uma mudança".
A Urbanos nasceu entre 1990 e 1991, apenas com capital próprio e a ajuda do pai e do tio, a trabalharem de borla. Alfredo saiu da Control Data dois anos depois e o grupo de logística ganhou várias especialidades: além das mudanças de habitação e de escritórios, destacam-se as obras de arte e a distribuição de publicações.
O empresário tornou-se milionário durante as duas décadas seguintes e houve mais sucessos. Em 2010, a Urbanos foi eleita a melhor pequena e média empresa para trabalhar em Portugal. No início de 2012, Alfredo Casimiro ficou com a maioria da Groundforce, através de uma posição de 50,1%. Em 2013, o grupo de logística tentou concorrer à privatização dos CTT e no ano seguinte queria ficar com a totalidade da empresa de handling.
Depois de a troika sair de Portugal começaram os problemas: o grupo Urbanos esteve em processo especial de revitalização em 2016 e deixou o negócio da distribuição de publicações no ano seguinte. Alfredo Casimiro praticamente deixou de aparecer em público mas parte da família continua a morar em Cabanas de Torres. É lá, na Quinta do Avô Luís, que se podem encontrar os bustos de alguns dos familiares que moldaram o empresário.
Quanto à Groundforce, continua tudo em aberto. A empresa corre o risco de falência e uma nacionalização não está excluída.
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