Bruxelas pressionou fortemente os fabricantes de automóveis, obrigando-os a investir fortunas em motores mais limpos, sob a ameaça de pesadas multas. Mas depois ofereceu-lhes os PHEV, para compensar.
A factura a pagar pela existência de automóveis eléctricos mais amigos do ambiente, imposta pela União Europeia, está a ser suportada pelos fabricantes, que tiveram de investir muito dinheiro numa tecnologia que não dominavam, mas também pelos clientes, que têm de pagar mais pelos veículos a bateria. Para “estimular” a produção de carros eléctricos, Bruxelas determinou que a média de emissões de CO2/km da gama de cada fabricante, comercializada durante 2020, terá de ficar abaixo dos 95g, sob pena de fortes penalizações para os incumpridores. A meta estabelecida para o próximo ano vai ser ainda mais apertada, primeiro em 2025 e, depois, em 2030.
Contudo, talvez por estarem conscientes que estavam a exigir demasiado, os líderes europeus “deram um doce” aos fabricantes, permitindo-lhes uma pequena “habilidade” para que seja possível cumprir o limite imposto. O recurso que tornará possível ficar abaixo dos 95g já no próximo ano dá pelo nome híbrido plug-in (PHEV), veículos em que o motor principal (a gasolina ou a gasóleo) não só usufrui do apoio de um motor eléctrico para o ajudar a andar mais e a consumir menos – sendo esta a parte híbrida do PHEV –, como a bateria que alimenta o motor eléctrico tem capacidade suficiente para fazer com que o veículo consiga percorrer cerca de 50 km em modo exclusivamente eléctrico, surgindo aqui a componente EV do PHEV.
Em si mesmo, um PHEV não será uma “habilidade”. Desde que seja utilizado tal como defende o princípio que preside à sua concepção, isto é, recarregando a bateria em todas as oportunidades, para que as deslocações no dia-a-dia sejam quase exclusivamente em modo eléctrico, o que deixaria a utilização híbrida apenas para as deslocações maiores, em que o motor a combustão assume a primazia. O problema é que muitos condutores nunca carregam a bateria, especialmente nos veículos maiores e mais caros, escolhendo os PHEV apenas pelas vantagens fiscais que lhes são concedidas.
A tal “habilidade”, acima referida, tem especificamente a ver com o facto de a norma que determina os consumos dos PHEV considerar apenas os primeiros 100 km, e não os segundos ou os terceiros, partindo ainda do princípio que a bateria está sempre cheia no início do percurso. Isto faz com que veículos com 300 ou 600 cv anunciem, respectivamente, 1,5 ou 4,7 l/100 km, com emissões igualmente baixas e impossíveis de reproduzir em condições reais de utilização. Por exemplo, um Porsche Cayenne Turbo S E-Hybrid (680 cv) anuncia 4,8 l/100 km, com 32 km de autonomia em modo exclusivamente eléctrico, o que lhe permite homologar 90 g/km de CO2. Enquanto isso, um Renault Clio, com quase um sexto da potência (TCe de 130 cv com caixa automática), regista um consumo de combinado de 5,7 l/100 km, a que correspondem emissões de CO2 na casa dos 130 g/km. Outro exemplo: o BMW X5 xDrive45e (394 cv) homologa um consumo médio de 1,7 l/100 km e emissões de apenas 39 g/km, porque percorre entre 67 a 87 km (WLTP) em modo eléctrico. Mas o menos sôfrego dos novos Peugeot 2008 a gasolina (PureTech 100 S&S) não se livra dos 123 g de CO2 por cada quilómetro que percorre.
Apesar dos PHEV não serem tão verdes como anunciam, especialmente pelos condutores que não recarregam as baterias, a realidade é que a actual regulação permite-lhes serem usados pelos fabricantes como expediente para cortar (artificialmente) entre 50 e 80% das emissões de CO2, ajudando a posicioná-los abaixo dos 95g no final de 2020.
https://observador.pt/2019/10/09/o-milagre-dos-phev-pode-safar-os-construtores/
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