A análise do Gabinete de Estratégia e Planeamento do Ministério do Trabalho e da Segurança Social conclui que "a aplicação integral da fórmula, num ano atípico como o que vivemos", teria um impacto imediato no saldo do sistema.
Aplicar a fórmula de atualização das pensões em 2023 na sua totalidade ia levar o saldo da Segurança Social a negativo no fim desta década. As contas que foram feitas pelo Governo e já enviadas à Assembleia da República explicam que em vez de se aplicar a fórmula de atualização automática das pensões que levaria a aumentos entre 7,1% e 8% nas pensões em 2023 este acréscimo seria repartido por um adiantamento extraordinário e não repetível equivalente a meia pensão em outubro e por aumentos entre 3,4% e 4,43% no próximo ano.
A notícia é avançada pelo jornal Público (acesso condicionado) que explica que vários elementos do executivo justificam em decisão com a necessidade de garantir a sustentabilidade da Segurança Social, para além de alertarem para o facto de Fundo de Estabilização Financeira (uma reserva que permitirá pagar as pensões nos períodos em que a receita contributiva for inferior à despesa) teria menos 13 anos de existência esta decisão não tivesse sido tomada.
A análise do Gabinete de Estratégia e Planeamento do Ministério do Trabalho e da Segurança Social simula o que aconteceria se a fórmula automática de atualização das pensões fosse aplicada em 2023. Esta simulação mantém a estimativa para as receitas com contribuições e quotizações dos trabalhadores e dos empregadores e introduz alterações às despesas com pensões, que passam a registar, entre 2023 e 2060, um valor superior a mil milhões de euros mais alto do que o que estava previsto no Orçamento do Estado (OE) para este ano.
O Governo conclui que "a aplicação integral da fórmula, num ano atípico como o que vivemos", teria um impacto imediato no saldo do sistema, com os primeiros défices a ocorreram cinco anos mais cedo do que o esperado. Ou seja, no final "da década de 2020, podendo atingir valores negativos até 1% do PIB no final da década de 2030".
O Gabinete de Estratégia e Planeamento do Ministério do Trabalho e da Segurança Social prevê que em 2030 o défice ultrapassaria os 1000 milhões de euros, e 3314 milhões em 2040. Nos 10 anos seguintes reduziria para os 3146 milhões de euros. Da mesma forma o Fundo de Estabilização Financeira, que atualmente conta com cerca de 24600 milhões de euros, desapareceria antes do prevista - no início da primeira metade da década de 2040 -, o que poria em causa "metade da evolução positiva" dos últimos anos.
Como explica aquele jornal, ao justificar não aplicar fórmula de atualização das pensões em 2023, o Governo poderá estar a assumir que a sua decisão pode levar a pensões mais baixas todos os anos a seguir ao próximo. Uma melhoria do saldo do sistema corresponde na mesma proporção uma redução dos rendimentos dos reformados portugueses.
BE considera cálculo "uma profunda aldrabice"
A coordenadora do BE considerou que os cálculos das pensões que o Governo enviou ao parlamento "são uma profunda aldrabice", pelo que o partido vai requerer a audição do Grupo de Estudos e Planeamento da Segurança Social.
"Acho absolutamente inaceitável que o Governo tenha dito que precisava de cortar na evolução das pensões sem nunca mostrar cálculos. E depois de o BE exigir esses cálculos, ter mandado um documento para a Assembleia da República que é ele, também, mais um truque, mais uma aldrabice", acusou Catarina Martins.
Para a dirigente bloquista, "não são cálculos nenhuns" o que está no documento enviado pelo Ministério do Trabalho e Segurança Social para a Assembleia da República.
"O Governo mandou um papel que vale zero. Que diz algo como 'se nós atualizássemos as pensões, mas não existisse inflação'. As pensões têm de ser atualizadas porque há inflação", defendeu.
A coordenadora do BE falava aos jornalista no mercado do Fundão, no distrito de Castelo Branco, onde contactou com produtores locais e ouviu preocupações sobre o aumento da inflação e do impacto desta na sua atividade e no preço dos produtos.
Na opinião da líder do BE, as "contas que dizem o que é que acontecia se nós atualizássemos as pensões e não existisse a inflação são só mais uma aldrabice, são só mais um truque" "é profundamente lamentável que o Governo tente justificar uma decisão política de revisão em baixa das pensões, descredibilizando a Segurança Social".
"Está, aliás, a fazer o pior trabalho que a direita poderia imaginar, ou poderia querer. Nós vamos chamar ao parlamento o Grupo de Estudos e Planeamento da Segurança Social. Registámos que não assinou nenhuma previsão, como não podiam assinar, porque há quem na Segurança Social trabalhe, com autonomia, com independência, a fazer previsões. E estes cálculos que o Governo diz que enviou são uma profunda aldrabice, são um desrespeito para com a Segurança Social", insistiu.
E prosseguiu: "São um desrespeito, eu diria, pela nossa inteligência. Os pensionistas não são parvos, a Assembleia de República também não. E, portanto, o Governo não pode mandar cálculos, que são uma perfeita aldrabice e esperar que a gente os aceite. Não. Queremos ouvir o Grupo de Estudos e Planeamento para ver se alguém explica as conta que o Governo ainda nunca explicou".
Catarina Martins disse também aos jornalistas que o Governo "primeiro dizia que ia apoiar os pensionistas", o que "é mentira", porque "afinal vai rever em baixa a evolução das pensões".
"Depois, dizia que em 2024 podia vir a compensar. Já se percebeu que também não há nenhuma compensação para o futuro. Disse depois que ia mandar os cálculos e não mandou os cálculos. Mandou uma folha que é uma aldrabice. (...) É ridículo, ninguém acredita nisto. É tratar os pensionistas como parvos, é tratar o parlamento como parvo, não possível, não é tolerável", concluiu.
O primeiro-ministro rejeitou, no dia 12, ter usado de qualquer truque ao anunciar o aumento das pensões, entre este ano e o próximo, e disse que o Governo quis evitar um acréscimo de despesa permanente de dois mil milhões de euros.
António Costa sublinhou que, desde 2015, o Governo conseguiu aumentar em 26 anos a capacidade do fundo de estabilização financeira da Segurança Social, mas alertou que, se se aumentassem no próximo ano as pensões de acordo com a fórmula de cálculo em vigor, seriam perdidos 13 destes 26 anos, o que volta a referir o estudo hoje entrado no parlamento.
"O que não poderíamos fazer de forma responsável era ter um ano de inflação absolutamente extraordinário e atípico, como este, e transformá-lo num efeito permanente", afirmou António Costa, em entrevista à TVI/CNN Portugal.
O primeiro-ministro reiterou que o executivo teve duas preocupações na hora de decidir como proteger os pensionistas do aumento da inflação: garantir a recuperação do poder de compra "perdido hoje" e "garantir a sustentabilidade futura da Segurança Social".
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