A mobilização de civis tem sido alvo de críticas até pelos mais fiéis apoiantes de Vladimir Putin e do Kremlin, com um influente comentador a pedir que os responsáveis pelo caos fossem enviados para a linha da frente.
A mobilização militar parcial anunciada por Vladimir Putin tem gerado muita confusão, controvérsia e críticas um pouco por toda a sociedade russa, e nem os mais fiéis veículos de propaganda do Kremlin escondem o seu desconforto. Num dos mais importantes espaço de comentário da televisão russa, o comentador Vladimir Solovyov e a diretora da televisão RT, Margarita Simonyan, queixaram-se do caos em torno do processo de recrutamento.
À medida que mais civis sem qualquer experiência militar são recrutados para lutar na Ucrânia, Solovyov admitiu que "há muitas chamadas em pânico" no seu telemóvel, "o que demonstra que muitas pessoas envolvidas esqueceram-se como fazer o seu trabalho".
A diretora da RT confessou-se confusa e chateada, acreditando pelo anúncio de Putin que seriam apenas chamadas pessoas com experiência militar. Margarita Simonyan mencionou exemplos de jovens doentes, pessoas com doenças graves, professores, músicos e até mães solteiras, que foram recrutados para combater.
"Temos um milhão de desempregados em Moscovo. Porquê chamar as pessoas com empregos, especialmente as que trabalham em serviços essenciais? Todos os idiotas nestas posições, que decidiram chamar um músico ou uma pessoa com um milhão de doenças, apesar do anúncio especificar exceções, não deviam ser castigados; deviam ser os primeiros a ser enviados para a linha da frente", salientou também Vladimir Solovyov, o apresentador do programa.
Two of Putin's top propagandists, head of RT Margarita Simonyan and state TV host Vladimir Solovyov, are aghast at how poorly his "partial mobilization" is going. They worry about the consequences that might follow in the near future. More in my article ⤵️https://t.co/STJfi4j2x5 pic.twitter.com/fJ8KtwlHyT
— Julia Davis (@JuliaDavisNews) September 26, 2022
Apesar das várias críticas à forma como a mobilização está a ser conduzida - dúvidas que também surgiram de dentro do parlamento russo e de altos cargos afetos ao Kremlin -, o painel continuou a defender Vladimir Putin, deixando claro que quem o tentar descredibilizar não o deve fazer, já que o presidente "formulou claramente os critérios" e que "algumas pessoas preferiram não os seguir".
"Não brinquem com as pessoas. Todas elas têm telemóveis e não ficarão em silêncio. Se lhes derem coisas podres, se não lhes derem capacete ou proteção, elas não o vão esconder", avisou o apresentador.
Já Margarita Simonyan usou o exemplo do icónico motim a bordo do navio russo Potemkin, em 1905, que começou como um protesto contra o fornecimento de rações podres na frota russa e culminou com a revolta de todos os marinheiros a bordo - um evento que se tornou simbólico antes da eventual revolução de 1917.
"Pequenas coisas como estas levaram ao primeiro motim militar na história do nosso país. É isso que querem? Estão a brincar com pessoas armadas", rematou Simonyan.
Ainda assim, a diretora da RT, a mais famosa televisão russa, justificou a mobilização parcial como "uma medida necessária" contra a "forte resistência da NATO e do Ocidente", julgando que a invasão pudesse ser concluída "com menos sangue". E atacou ainda as mães de jovens que têm protegido os seus filhos da mobilização, classificando-as como "vergonhosas".
A Rússia continua a lidar com vários protestos contra o recrutamento forçado de homens civis para o campo de batalha, especialmente em regiões mais remotas e onde a etnia russa é uma minoria. No Daguestão, por exemplo, vários especialistas têm alertado para o aumento exponencial da dissidência em relação ao Kremlin e ao Estado russo, e a polícia tem tido dificuldades em suprimir os protestos contra a mobilização.
Muitos, em vez de protestar, optaram antes por sair do país. Com as viagens de avião esgotadas no espaço de horas após o anúncio da mobilização, as fronteiras terrestres com a Geórgia, a Mongólia, a Finlândia e o Azerbaijão ficaram rapidamente entupidas com filas de carros. O órgão independente russo Meduza estima que já tenham saído do país mais de 250 mil pessoas após o anúncio de Putin.
A guerra na Ucrânia já fez mais de 5.900 mortos entre a população civil ucraniana, segundo contam os dados do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos. No entanto, a organização adverte que o real número de mortos civis poderá ser muito superior, dadas as dificuldades em contabilizar mortos em zonas ocupadas ou sitiadas pelos russos - em Mariupol, por exemplo, estima-se que tenham morrido milhares de pessoas.
Apoiantes de Putin criticam mobilização e pedem castigo para responsáveis (noticiasaominuto.com)
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