Avançar para o conteúdo principal

Estará Trump a sabotar Biden ou, cumprindo à pressa algumas promessas, a posicionar-se para 2024?



"Se Trump perde o poder vai passar os seus últimos 90 dias a demolir os EUA como um criança maliciosa com uma marreta numa loja de louça”. A previsão é do analista político Malcom Nance. O ainda Presidente vai sabotar a transição para a administração de Joe Biden?
EXPRESSO


No início da semana soube-se que esteve em cima mesa da Sala Oval, na Casa Branca, um ataque militar contra o Irão. A notícia saiu dos teclados do “New York Times” e deu conta de uma ideia de Donald Trump, que remonta à semana passada, para reagir ao aumento de urânio enriquecido nas reservas iranianas. O vice-Presidente, Mike Pence, o secretário de Estado, Mike Pompeo, o novo secretário de Defesa interino, Christopher Miller, e o chefe do Estado-Maior, o general Mark Milley, estavam presentes na mesma sala e terão sidos eles a dissuadir o ainda Presidente dos Estados Unidos. Aquela decisão, que envolvia ataques com mísseis e outros de cariz cibernético, "podia facilmente escalar para um conflito mais amplo", avisaram.

Teria Trump tido a mesma intenção se ganhasse as eleições? Estará a tentar deixar um legado para assinalar esta derradeira caminhada para a transição de poder? Terá em mente tirar o tapete a Joe Biden, o Presidente eleito? Estará com pressa para cumprir algumas das suas promessas para concorrer em 2024 e mostrar trabalho feito? Estamos em terrenos do desconhecido e talvez as suas intenções ou decisões, umas mais aceleradas e espontâneas do que outras, poderão dar alguns sinais e deixar pistas.

Depois de acusar Biden de ser permeável aos interesses da China, o site norte-americano de notícias “Axios” revelou no domingo que Trump estará a ponto de decretar algumas políticas de linha dura, nestas 10 semanas que faltam para terminar o seu mandato, para tornar insustentável uma mudança de paradigma ou estratégia para a administração Biden. O “Axios”, que se baseia em fontes governamentais, refere que Trump pretende cimentar o seu legado naquele país asiático. Estão previstas sanções e restrições para empresas, entidades governamentais e funcionários chineses, alegando que, para além de ser uma ameaça nacional para os EUA, a China é cúmplice em violação dos direitos humanos em Xinjiang e Hong Kong. "A menos que Pequim reverta o curso [da história] e se transforme num player responsável no cenário global, será politicamente suicida para os futuros presidentes dos EUA reverterem as ações históricas do presidente Trump”, disse ao “Axios” o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, John Ullyot.

Nestes últimos dias ficou a saber-se também que Trump ordenou que o Pentágono acelere a redução das tropas americanas no Afeganistão e no Iraque, para que fiquem 2.500 militares em cada um desses países. De acordo com a “Bloomberg”, o ainda Presidente está a trabalhar para cumprir uma das suas promessas até janeiro: sair de “guerras sem fim”. Ou seja, de acordo com o secretário da Defesa interino, Christopher Miller, vai observar-se nos próximos tempos à redução de 4500 soldados no Afeganistão e 3000 no Iraque. Qual é o prazo previsto para isto acontecer ou pelo menos estar fechado? Uma semana antes de Biden tomar posse como o 46.º Presidente dos Estados Unidos.

Para além de a Casa Branca ter ordenado a Miller que se foque nas guerras cibernéticas, com especial atenção na China, estarão também em curso novas designações de terroristas no Iémen, o que pode dificultar os esforços para alcançar-se a paz naquele território, escreve a CNN. Mais: Trump terá viabilizado a venda de armas em larga escala, algo que poderá afetar Médio Oriente.

Uma coisa é certa: numa altura em que é imprevisível e pouco animador o formato da transição, há memorandos para o mesmo efeito já preparados e redigidos, que descrevem políticas e opções. Em vez de haver uma comunicação com a futura administração, que poderiam levar a uma tomada de decisão ou até à pausa de outras, Trump vai avançando, diz a CNN. Um funcionário da Casa Branca disse ao mesmo canal que o objetivo de Trump passa por causar tantos fogos que será complicado para a administração Biden apagá-los e resolver tudo.

"Acho que ao tentar acelerar o processo de cumprir algumas das suas grandes promessas de política externa nos próximos meses, Trump está a tentar indicar à sua base que, se for eleito novamente, continuará a fazer exatamente o que prometeu ", explicou à CNN Charles Lister, investigador do Middle East Institute.

Esta ideia pode ajudar a explicar uma outra decisão de Trump, anunciada na segunda-feira pelo segundo candidato à Casa Branca mais votado de sempre, e que vai contra o que defende Joe Biden. Desta vez está em causa uma promessa feita à indústria do petróleo e do gás. Trump anunciou a abertura de um processo para outorgar concessões de petróleo e gás no refúgio ártico do Estado do Alasca. E tudo está previsto para acontecer antes do democrata Biden entrar na Casa Branca. “A perfuração de petróleo e gás pode exterminar os ursos polares da planície costeira do refúgio nacional de vida selvagem do Ártico”, escreveu num comunicado Jamie Rappaport Clark, o presidente e CEO da Defenders of Wildlife, citado pelo artigo do “Guardian” em cima mencionado. As comunidades indígenas naquela região também se mostraram desagradadas com a decisão de Trump e garantem que vão ser afetadas pelo arrendamento de terras no Ártico.

Finalmente, alguma imprensa, nomeadamente a CNN, vê outra tentativa de sabotagem na falta de coordenação deliberada de Trump com Biden no âmbito da vacina para a covid-19. Ao não admitir a derrota, ao tentar via judicial confirmar a alegada fraude das eleições, assim como tomando algumas decisões que podem atrasar a transição de poder para a Administração Biden, tudo isso poderá ter influência e atrasar a chegada da vacina, a sua viabilização e distribuição, mas também a forma como as pessoas a recebem, ao nível da informação. Politizar um tema de saúde pública pode ser perigoso quando tantas vidas estão em causa. A vacina da Pfizer e da BioNTech, por exemplo, revelou 95% de eficácia no final do ensaio clínico, segundo as empresas envolvidas. Os Estados Unidos já superaram, desde o início da pandemia, os 11 milhões de casos de infeção, dos quais morreram quase 250 mil pessoas.

"Se Trump perde o poder vai passar os seus últimos 90 dias a demolir os EUA como um criança maliciosa com uma marreta numa loja de louça”, disse há dez dias ao “Guardian” Malcom Nance, um analista político.

O QUE ESPERAR DE BIDEN NOS PRIMEIROS DIAS?
O Presidente eleito comprometeu-se a concretizar várias políticas para desviar os Estados Unidos da rota escolhida por Donald Trump. Biden, como explica este artigo da NPR, apontou a mira durante a campanha para temas económicos, ambientais, raciais e também relativos à saúde e educação. Mas não só: reverter o que Trump fez é um dos focos de Biden e Kamala Harris. E aqui entram a imigração, política externa e pandemia.

Uma das primeiras ações como Presidente eleito foi montar e anunciar uma equipa de especialistas para o aconselharem no combate à covid-19. O diretor do Instituto de Alergias e Doenças Infecciosas norte-americano, Anthony Fauci, chegou a dizer que seria muito útil para a população norte-americana se começasse a colaborar com a administração que entrará na Casa Branca em janeiro, o que sugere que isso não acontece.

"Duvido que vamos erradicar isto [covid-19]”, disse Fauci durante um 'webinar' com o Instituto Real de Relações Internacionais, na quinta-feira passada. “Precisamos de planear porque é algo que podemos precisar de manter sob controlo de forma crónica. Pode ser que se torne endémica, algo que temos de ter cuidado. De certeza que não vai continuar a ser pandémica durante muito mais tempo, porque acredito que as vacinas vão dar a volta.”

A NPR indica ainda que o plano ambicioso de Biden para os primeiros 100 dias comportam mais de uma dúzia de iniciativas para a imigração, por exemplo. O plano para o processo de transição e para implementar assim que entra pela porta da Casa Branca é vasto.

Criar uma task-force durante a transição presidencial estava no topo da lista e é algo que já aconteceu e anunciou. Depois, Biden quer, para além de implementar uma legislação imediata para a pandemia, criar pacotes de ajuda. A seguir, lançar-se-á um plano de distribuição da vacina. Biden pretende também ouvir os cientistas ao regressar para a Organização Mundial da Saúde, mantendo Fauci como conselheiro próximo.

O plano para os primeiros dias continua, diz a NPR. Na economia, por exemplo, Biden pretende reverter o corte de impostos corporativos de Trump. No ambiente, o candidato democrata e Presidente eleito quer transformar os EUA num líder internacional no que toca às alterações climáticas. Na imigração, uma das suas bandeiras, Biden quer travar a separação de famílias na fronteira EUA-México e ainda eliminar a ordem executiva de Trump que proíbe viajantes de alguns países de maioria muçulmana de entrarem no país.

A lista é longa, a ambição idem, mas os planos atuais e as decisões de última hora de Donald Trump, seja com vista a sabotar a transição seja a piscar o olho a 2024, podem fazer Biden alterar ou congelar alguns dos seus objetivos para o arranque do seu mandato como o 46.º Presidente dos Estados Unidos.

Comentários

Notícias mais vistas:

Aníbal Cavaco Silva

Diogo agostinho  Num país que está sem rumo, sem visão e sem estratégia, é bom recordar quem já teve essa capacidade aliada a outra, que não se consegue adquirir, a liderança. Com uma pandemia às costas, e um país político-mediático entretido a debater linhas vermelhas, o que vemos são medidas sem grande coerência e um rumo nada perceptível. No meio do caos, importa relembrar Aníbal Cavaco Silva. O político mais bem-sucedido eleitoralmente no Portugal democrático. Quatro vezes com mais de 50% dos votos, em tempos de poucas preocupações com a abstenção, deve querer dizer algo, apesar de hoje não ser muito popular elogiar Cavaco Silva. Penso que é, sem dúvida, um dos grandes nomes da nossa Democracia. Nem sempre concordei com tudo. É assim a vida, é quase impossível fazer tudo bem. Penso que tem responsabilidade na ascensão de António Guterres e José Sócrates ao cargo de Primeiro-Ministro, com enormes prejuízos económicos, financeiros e políticos para o país. Mas isso são outras questões

Supercarregadores portugueses surpreendem mercado com 600 kW e mais tecnologia

 Uma jovem empresa portuguesa surpreendeu o mercado mundial de carregadores rápidos para veículos eléctricos. De uma assentada, oferece potência nunca vista, até 600 kW, e tecnologias inovadoras. O nome i-charging pode não dizer nada a muita gente, mas no mundo dos carregadores rápidos para veículos eléctricos, esta jovem empresa portuguesa é a nova referência do sector. Nasceu somente em 2019, mas isso não a impede de já ter lançado no mercado em Março uma gama completa de sistemas de recarga para veículos eléctricos em corrente alterna (AC), de baixa potência, e de ter apresentado agora uma família de carregadores em corrente contínua (DC) para carga rápida com as potências mais elevadas do mercado. Há cerca de 20 fabricantes na Europa de carregadores rápidos, pelo que a estratégia para nos impormos passou por oferecermos um produto disruptivo e que se diferenciasse dos restantes, não pelo preço, mas pelo conteúdo”, explicou ao Observador Pedro Moreira da Silva, CEO da i-charging. A

Rendas antigas: Governo vai atribuir compensação a senhorios

 As associações que representam os senhorios mostraram-se surpreendidas com o "volte-face" do Governo. A Associação Lisbonense de Proprietários vai entregar uma petição no Parlamento, que já conta com quase 5.000 assinaturas, para acabar com o congelamento das rendas antigas. O Governo não vai, afinal, descongelar as rendas dos contratos de arrendamento anteriores a 1990, ao contrário do que está escrito na proposta do Orçamento do Estado. Após a polémica, o Ministério das Infraestruturas e da Habitação garantiu a criação de um mecanismo de compensação para os senhorios, mas não explicou como irá funcionar. Desde 2012 que está em vigor o novo regime de arrendamento urbano, que regula o mercado habitacional. Há mais de uma década que está suspensa a transição dos contratos anteriores a 1990 para o novo regime desde que os inquilinos cumpram um dos três critérios: terem 65 ou mais anos; incapacidade igual ou superior a 60%; ou um rendimento anual bruto corrigido inferior a cinc