Entre idas à praia e ao ginásio, sem peruca ou rabo de cavalo, Rendeiro pede €30 milhões a Portugal (e recebe o não de Marcelo)
Uma vida normal, em que não precisa de disfarçar-se com "peruca ou rabo de cavalo": é assim que está João Rendeiro num destino desconhecido, segundo revelou à CNN Portugal
João Rendeiro garantiu que vai colocar um processo nos “tribunais internacionais” contra Portugal – pelo atraso da Justiça – e em seguida pedir uma indemnização de cerca de 30 milhões de euros.
O montante é equivalente à indemnização solicitada pela comissão liquidatária do BPP no processo judicial em que o antigo banqueiro foi condenado a pena de prisão de 10 anos, ainda passível de recurso.
Na senda da argumentação de que a Justiça está a ser injusta consigo, João Rendeiro revelou, na entrevista que deu à CNN Portugal - em colaboração com o Tal & Qual e transmitida esta segunda-feira - que “está iminente” a entrada de um recurso nos “tribunais internacionais”, que não identificou, pela forma como está a ser tratado.
Porquê este recurso? “Tem que ver com a duração do processo: em termos internacionais, os processos que durem mais de sete anos são considerados processos em falha; ora os meus processos têm praticamente 14 anos, o dobro do aceitável”.
Rendeiro saiu do BPP em 2008, por afastamento determinado pelo Banco de Portugal, e só nos anos seguintes começou a ser alvo de acusações judiciais e dos supervisores.
No processo para a Justiça internacional há um objetivo: pedir uma indemnização. “Claro. É evidente que sim, [irei pedir] uma indemnização muito substancial”. Será na ordem dos 30 milhões de euros. “Se for concedida, será doada”, declarou.
O fundador do BPP foi alvo de um mandado de captura pela condenação a 5 anos e 8 meses por falsificação de documento e falsidade informática - que o Tribunal Constitucional considerou irrecorrível -, a que se juntam outras condenações em primeira instância por crimes de burla, fraude fiscal e branqueamento.
No processo de fraude fiscal e branqueamento, em que foi condenado a 10 anos de prisão (ainda passível de recurso), o coletivo de juízas condenou Rendeiro e os seus colegas na administração do BPP a pagarem uma indemnização de cerca de 30 milhões de euros à comissão liquidatária do banco, para que possa vir a ser utilizado na distribuição de recursos pelos seus credores.
O Estado também pede 4,9 milhões pelos impostos não pagos por prémios pagos enquanto era banqueiro através de paraísos fiscais.
Há anos que a narrativa de João Rendeiro é a do banqueiro alvo de conspirações por não fazer parte do sistema, nem da elite.
Um daqueles que diz que o atacaram foi Ricardo Salgado que, na entrevista à CNN Portugal, Rendeiro acusa de ter cometido muitos mais crimes, mas de não estar preso por pertencer aos ditos grupos privilegiados.
Aliás, no seu blogue "Arma Crítica", quando fugiu, escreveu uma publicação em que defendia que não voltaria ao país para não 'vítima' de uma “justiça injusta”.
NÃO SE DISFARÇA
Nessa altura, foi noticiado que o texto teria sido escrito a partir do Belize, onde Rendeiro se encontrava. O ex-banqueiro nega.
“Como é óbvio, não estou em Belize”. As palavras de Rendeiro foram proferidas em entrevista à CNN Portugal, a quem não disse em que geografia se encontra.
O ex-banqueiro não revela onde está, e a CNN Portugal e a TVI informaram que a videochamada foi feita através de um programa escolhido pelo próprio, para - justificaram assim - não ser possível identificar a origem.
Está num país virado para o mar, onde se fala português, transmitiu.
A vida que faz, atualmente, é a mesma que levava em Lisboa ou em Cascais. Praia e ginásio. E sem disfarce: “Nem ando de peruca, nem de rabo de cavalo”.
Está a trabalhar como consultor e até foi convidado para ser responsável financeiro de uma operação de 500 milhões de dólares, segundo declarou.
Não volta para Portugal, a não ser que não haja condenações ou que, havendo, haja um indulto presidencial. Neste momento isso não é possível, já avisou Marcelo Rebelo de Sousa.
O ex-banqueiro falhou os prazos, disse o Marcelo, usando precisamente o argumento escolhido por Rendeiro para ir para os tribunais internacionais.
A PROCURADORA
Fugiu porque sentiu que o cerco estava a apertar-se, não foi premeditado. "Na sala de embarque, onde embarquei para Londres, estava uma procuradora do DCIAP que me viu perfeitamente a tomar um voo para Londres", disse.
A Justiça sabia e foi informada dessa saída, como noticiou o Expresso quando a viagem aconteceu.
“TUDO É ESTRANHO”
Rendeiro tinha já dado uma pequena declaração ao Sapo 24 em que assumia responsabilidades pelo crime de descaminho, relativos às obras de arte, que deviam servir para pagar lesados do BPP e que foram vendidas. Repetiu-o à CNN Portugal. Maria Rendeiro foi constituída arguida por as obras sob a sua custódia terem desaparecido, algumas substituídas por alegadas falsificações. O seu marido – que Maria Rendeiro não acompanhou na fuga – diz que, se o objetivo da justiça ao indiciá-la é fazê-lo regressar, não vai ser bem-sucedida.
Em relação à ligação imobiliária com o pai e filho Florêncio de Almeida, que os colocou sob suspeita de branqueamento de capitais, Rendeiro não deu grandes explicações. “O meu motorista não tem direito a ser uma pessoa normal”, e fazer negócios imobiliários?, questionou-se. Em resumo, houve uma venda de imóveis a Florêncio Almeida pai, da Antral, que depois passou ao filho parte deles, que acabou depois por alienar. O dinheiro da venda permitiu-lhe a compra de um apartamento de luxo, na Quinta Patiño, onde vivia o casal Rendeiro. Um apartamento cujo usufruto foi cedido a Maria Rendeiro, mulher de João Rendeiro. Os preços foram adequados “face às circunstâncias em que os imóveis estavam”, justificou. Mais explicações têm de ser dadas por pai e filho, atirou o ex-banqueiro.
Não é tudo demasiado estranho? “Tudo é estranho quando se quer fazer estranho”, é o que diz Rendeiro.
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