Censurar a cultura? Livros da escritora de "Os Cinco" e "Noddy" estão a ser escondidos nas bibliotecas
As obras de Enid Blyton, uma das autoras mais conhecidas, estão a ser reescritas. Nas bibliotecas públicas, as versões originais estão armazenadas em locais não acessíveis. Esta decisão trouxe a público uma questão relevante.
Enid Blyton é uma das autoras de livros infantis mais queridas do Reino Unido, cujas obras estão entre as mais traduzidas do mundo. Porém, o legado deixado pela escritora, que faleceu em 1968, não está a ser visto com bons olhos por estar a ser “reescrito”.
As obras de qualquer autor são autênticas provas da história da Humanidade. São também provas do passado, das vivências e das mentalidades da sociedade de então.
Não é possível reescrever o passado, mas aparentemente é possível reescrever obras passadas. E o que está a acontecer com os livros de Enid Blyton é apontado como “censura”.
De uma coleção de mais de 700 livros escritos pela escritora britânica, vários clássicos estão a ser mantidos em sigilo nas bibliotecas por “medo de ofender os leitores” no Reino Unido, informa o The Telegraph.
Em contrapartida, as bibliotecas públicas de Denver, na Inglaterra, oferecem “versões atuais” das obras mais vendidas de Blyton.
Em causa, indica o jornal Daily Mail, está uma “linguagem desatualizada e ofensiva” utilizada nas obras. Mais precisamente, a escritora que nasceu em 1897 recorreu a termos como “queer”, “gay”, “castanho” em referência à cor da pele de uma personagem, e a expressão “cala a boca”.
As versões originais que ainda estão listadas no site não foram removidas, mas sim armazenadas em espaços não acessíveis ao público. Mas se os leitores quiserem ter acesso às originais, terão de as solicitar especificamente aos bibliotecários.
Estas alterações foram reveladas nos documentos do Conselho do Condado de Devon. A Library Unlimited, que administra o serviço de biblioteca do município, audita regularmente os livros e posteriormente substitui-os por “versões atuais”.
"Nos livros que tenham linguagem que seja cada vez mais datada", afirmou a Libraries Unlimited. Dando o exemplo das obras de Enid Blyton, "as bibliotecas continuarão a adquirir novas edições onde as editoras tenham atualizado a linguagem".
Decisão está a provocar onda de indignação
A livraria Belfast Books promoveu os livros infantis e juvenis de Blyton ao escrever “a maioria são originais de um tempo antes de os ‘leitores sensíveis’ nos dizerem o que poderíamos ou não poderíamos ler”.
Os fãs da escritora britânica seguiram o exemplo e partilharam nas redes sociais fotografias de livros de Enid Blyton empilhados nas prateleiras das suas casas, numa clara manifestação de solidariedade.
"Os livros de Enid Blyton estão orgulhosamente exibidos na minha estante inferior, não podemos reescrever ou relegar a história, ela está escrita", escreveu uma leitora.
A organização britânica que defende a liberdade de expressão, intitulada Free Speech Union, denuncia que “Enid Blyton é a mais recente autora infantil cujo trabalho foi ‘modernizado’ por leitores de ouvidos atentos”.
A instituição de caridade English Heritage atualizou as informações sobre Enid Blyton, informa o The Washington Post.
“O trabalho de Blyton foi criticado durante a sua vida e depois pelo racismo, xenofobia e a falta de mérito literário”, lê-se no site, citando uma reportagem de 1996 do The Guardian que explora o livro “The Little Black Doll”, cuja personagem “Sambo” apenas é aceite quando a sua “cara preta feia” é “limpa” pela chuva.
No ano passado, a autora de livros infantis, Jacqueline Wilson, reformulou a obra “The Magic Faraway Tree”, de 1943. Em causa estava uma narrativa sexista de como mulheres fazerem trabalho doméstico.
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