Tribunal de Contas considera que “as situações de delonga na autorização da secretária de Estado podem ser reveladoras de inobservância de uma boa gestão e administração dos dinheiros públicos”.
Portugal poderá ter de pagar 44,6 milhões de euros em juros por atrasos no pagamento à Comissão Europeia dos Recursos Próprios Tradicionais, segundo uma auditoria aos fluxos financeiros entre Portugal e a União Europeia do Tribunal de Contas (TdC). O problema é “recorrente” e pode ser entendido como má gestão do dinheiro público. O Tribunal, no mesmo documento, alerta para a necessidade de melhorar a qualidade do reporte da utilização dos fundos europeus e acelerar a execução dos mesmos para não se devolverem verbas a Bruxelas.
Segundo a Autoridade Tributária, em março de 2023 havia 23 processos pendentes de Recursos Próprios Tradicionais não cobrados, no total de 99,9 milhões de euros”, ou seja, direitos aduaneiros cobrados nas importações de produtos provenientes de países terceiros, e que são uma das quatro fontes de receita do Orçamento da UE. “Deste valor foram efetuados pagamentos condicionais no âmbito de 12 processos (76,1 milhões de euros), entre 2013 e 2022. Em relação a todos os processos a AT referiu a possibilidade de pagamentos acrescidos a título de juros que podem atingir valores avultados (estimativas para três processos: 44,6 milhões de euros)”, escreve o Tribunal de Contas. Cerca de 96% deste valor está relacionado com um diferendo que se arrasta desde 2012, entre a Comissão Europeia e o Reino Unido, que importou têxteis e calçado da China e os exportou para vários países da UE, incluindo Portugal.
Só em 2022 “foram pagos à Comissão Europeia juros no montante de 90,04 mil euros em resultado de atrasos na transferência dos montantes devidos de Recursos Próprios Tradicionais”. Além disso, “estes juros são pagos com significativa demora e geram suscetibilidade de instauração de processo de infração contra Portugal”, acrescenta a instituição liderada por José Tavares.
O Tribunal detalha, por exemplo, que no caso do processo Eurofenice, relativo à importação de peitos de frango congelados sem osso originários do Brasil, a DGO submeteu à secretária de Estado do Orçamento os pedidos de autorização do pagamento à Comissão Europeia em maio de 2022 e, depois de várias insistências, o gabinete só deu orientações para que fossem efetuados os pagamentos pendentes a 27 de dezembro desse ano. “Mais de sete meses decorridos sobre o envio da primeira informação da DGO à tutela, situação que terá por consequência um acréscimo de juros a pagar”.
E como não é caso único, como relata o Tribunal de Contas que já tinha alertado para o problema em anos anteriores, a auditoria considera que “as situações de delonga na autorização da SEO podem ser reveladoras de inobservância de uma boa gestão e administração dos dinheiros públicos”.
Nesta auditoria o Tribunal de Contas analisou ainda a execução financeira dos programas que em Portugal concretizam a aplicação dos fundos europeus, com particular relevo para o PT2020, o PT2030 e o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
Quanto ao PT2020 houve uma “aceleração na sua execução”, até porque o quadro tinha de estar concluído até final de 2023. “Os dados auditados de 31 de dezembro de 2022 revelam uma execução acumulada de 83,8% e os dados divulgados de 30 de setembro de 2023 (não auditados) revelam uma execução acumulada de 93%”, lê-se no documento. Mas já há dados mais recentes que apontam para uma taxa de execução de 96% no final de novembro.
Apesar do desfasamento temporal dos dados, o Tribunal de Contas deixa alguns alertas dizendo que há fundos que apresentavam “níveis de absorção ainda preocupantes”. “Os fundos que apresentavam maior risco de não absorção total até ao final de 2023 continuavam a ser o FEAMP e o Fundo de Coesão. Os dados divulgados a 30 de setembro de 2023 evidenciavam que, a três meses do final do período de utilização, faltava absorver nesses fundos, respetivamente, 10 e 13%”, frisa a instituição que se mostra apreensiva também com os reforços introduzidos no PT2020, no âmbito do REACT-EU e do Desenvolvimento Rural, que “apresentavam graus de execução insuficientes (67% no final de 2022, 79% em setembro de 2023)”.
Recomendando ao Governo que promova “o aceleramento da generalidade dos programas de financiamento europeu, por forma a evitar perdas de fundos”, o Tribunal de Contas aponta ainda o dedo ao facto de ter havido “uma incorreta e inconsistente contabilização das verbas do PRR na Conta Geral do Estado, a qual não refletiu a totalidade dos montantes recebidos pelos beneficiários que integram o perímetro orçamental”.
Não ter sido apresentado pela Direção Geral do Orçamento nenhum relatório trimestral com a análise da execução orçamental do PRR, como exige a lei e a informação publicamente disponibilizada no final de 2022 sobre a monitorização do PRR revelar inconsistências que punham em causa a fiabilidade dessa informação.
Portugal arrisca pagar 44 milhões em juros de mora a Bruxelas – ECO (sapo.pt)
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