Avançar para o conteúdo principal

Mais mortes do que nascimentos. 2017 terá batido o recorde do século

São dados provisórios ainda. Mas indicam que em 2017 houve mais 24 mil mortes do que nascimentos, o maior saldo negativo desde 2000. População está a encolher há nove anos consecutivos.

A população portuguesa voltou a diminuir em 2017. O saldo natural negativo, que acontece pelo nono ano consecutivo, não surpreende os especialistas. Mas a sua dimensão gera preocupação: enquanto em 2009, primeiro ano em que o total de óbitos suplantou o de nascimentos, se ficou por perto de cinco mil, no ano passado terá rondado os 24 mil, segundo dados ainda provisórios.

Mesmo sem levar em consideração os fluxos migratórios, que têm sido sempre negativos nos últimos anos, e fazendo contas por alto, entre 2009 e 2016 perdemos quase 150 mil habitantes. “É uma tendência de declínio que se vem agravando de ano para ano. Temos menos nascimentos e, mesmo que haja oscilações [como aconteceu em 2015 e 2016, quando a natalidade aumentou um pouco], nunca conseguiremos recuperar os números de há alguns anos”, sintetiza a presidente da Associação Portuguesa de Demografia (APD), Maria Filomena Mendes.

Ao mesmo tempo, prossegue, “andamos a empurrar a morte para cada vez mais tarde, mas a população em risco de morrer em idades mais avançadas é cada vez maior e este facto — o de termos uma população muito envelhecida — faz com que haja mais mortes”.

Não definitivos, porque têm de ser ajustados para filtrar eventuais duplicações e erros, como avisa um especialista da Direcção-Geral da Saúde (DGS), os dados já disponíveis, que o PÚBLICO cruzou, indicam que o saldo natural em 2017 poderá ser o mais elevado deste século (com os óbitos a suplantar ainda mais os nascimentos do que em anos anteriores).

No ano passado, entre Janeiro e Dezembro, o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (Insa) contabilizou 86.180 “testes do pezinho”, rastreio feito à nascença, enquanto o sistema informático de certificados de óbito gerido pela DGS somava no final do ano 110.197 mortes. Um saldo natural negativo superior a 24 mil.

“A esperança de vida aumenta mas a população tem vindo a envelhecer”, justifica o epidemiologista do Insa, Baltazar Nunes, que recorre a uma imagem para descrever o fenómeno: “A pirâmide etária está a perder o formato de pirâmide, está a ficar com gorduras na cintura.”

Neste contexto, para rejuvenescer a envelhecida população portuguesa seria necessário “um ritmo de entradas [de imigrantes ou emigrantes que regressam ao país] da ordem das dezenas ou centenas de milhares por ano”, calcula Jorge Malheiros, do Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa.

O limiar “psicológico”
Ao contrário do que está a acontecer em Portugal, na União Europeia (UE), a maior parte dos países ainda consegue ganhar população, graças à imigração. Em 2016, segundo os últimos dados oficiais do Eurostat, o gabinete de estatísticas da UE, havia 18 países nesta situação. Portugal figurava na lista dos dez que estavam a perder habitantes, em conjunto com a Lituânia, Letónia, Croácia, Bulgária, Roménia, Hungria, Grécia, Itália e Estónia.

Nesse ano, apesar de se ter verificado um ligeiro aumento de nascimentos, muito aplaudido no país, Portugal registou a segunda taxa de natalidade mais baixa dos 28 Estados-membros (8,4 nascimentos por mil habitantes), apenas à frente de Itália. E, com os óbitos a suplantarem a fasquia dos 110 mil, a população recuou para 10,309 milhões em Janeiro de 2017.

Do ponto de vista do crescimento natural, o futuro não se afigura risonho. As projecções mais recentes do Instituto Nacional de Estatística (INE), apesar de incluírem cenários mais optimistas e menos optimistas, apontam para uma redução acelerada da população nas próximas décadas: poderemos mesmo passar dos actuais 10,3 milhões para apenas 7,5 milhões em 2080 segundo o INE, que calcula que a população fique abaixo do limiar “psicológico” dos 10 milhões, já a partir de 2031.

Jorge Malheiros acredita que até possa ocorrer antes. Com o número médio de filhos por mulher em idade fértil a rondar actualmente os 1,3, a léguas dos 2,1 necessários para assegurar a renovação das gerações, sem ser compensado pela imigração, cada vez haverá menos jovens, enquanto, do lado oposto da pirâmide, o número de idosos não parará de aumentar. Uma conjugação de factores que conduzirá ao rápido aumento da taxa de envelhecimento. O país está a envelhecer muito depressa e este é que é o problema central, enfatizam Jorge Malheiros e Maria Filomena Mendes.

Portugal precisa de mais imigrantes para não encolher
Ainda assim, o geógrafo acredita que há condições para que o declínio populacional se inverta, se Portugal retomar os valores médios das taxas de crescimento económico de há alguns anos. Aí, sustenta, haverá até necessidade de mais mão-de-obra e nesse caso passaremos a ter um saldo migratório positivo — que se tornou negativo sobretudo durante os anos de crise económica, quando a emigração disparou e perdemos capacidade para atrair trabalhadores estrangeiros.

“Se tivermos capacidade para fixar mais imigrantes, Portugal poderá não continuar a perder população”, antecipa Maria Filomena Mendes, notando que pela via da natalidade já será extremamente difícil a inversão do fenómeno. “O declínio da natalidade já tem décadas”, lembra a demógrafa. “Mesmo que a fecundidade aumentasse muito, temos cada vez menos mulheres em idade de ter filhos. E [ter filhos] é uma decisão complexa, num país em que os baixos rendimentos, o desemprego jovem, as questões da habitação e da precariedade laboral persistem”.

https://www.publico.pt/2018/01/22/sociedade/noticia/mais-24-mil-mortes-do-que-nascimentos-populacao-encolhe-ha-nove-anos-consecutivos-1800123?page=/&pos=1&b=stories_cover__important_c

Comentários

Notícias mais vistas:

Diarreia legislativa

© DR  As mais de 150 alterações ao Código do Trabalho, no âmbito da Agenda para o Trabalho Digno, foram aprovadas esta sexta-feira pelo Parlamento, em votação final. O texto global apenas contou com os votos favoráveis da maioria absoluta socialista. PCP, BE e IL votaram contra, PSD, Chega, Livre e PAN abstiveram-se. Esta diarréia legislativa não só "passaram ao lado da concertação Social", como também "terão um profundo impacto negativo na competitividade das empresas nacionais, caso venham a ser implementadas Patrões vão falar com Marcelo para travar Agenda para o Trabalho Digno (dinheirovivo.pt)

OE2026: 10 medidas com impacto (in)direto na carteira dos portugueses

  O Governo entregou e apresentou a proposta de Orçamento do Estado para o próximo ano, mas com poucas surpresas. As mudanças nos escalões de IRS já tinham sido anunciadas, bem como o aumento nas pensões. Ainda assim, há novidades nos impostos, alargamento de isenções, fim de contribuições extraordinárias e mais despesa com Defesa, 2026 vai ser “um ano orçamental exigente” e a margem disponível para deslizes está “próxima de zero”. A afirmação em jeito de aviso pertence ao ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, e foi proferida na  apresentação da proposta de Orçamento do Estado  para o próximo ano. O excedente é de cerca de 230 milhões de euros, pelo que se o país não quer voltar a entrar num défice, a margem para mais medidas é "próxima de zero". "Os números são o que são, se não tivéssemos os empréstimos do PRR não estaríamos a fazer alguns projetos", apontou, acrescentando que não vai discutir o mérito da decisão tomada relativamente à 'bazuca europ...

Bruxelas obriga governo a acabar com os descontos no ISP

 Comissão Europeia recomendou o fim dos descontos no imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos O ministro das Finanças garantiu que o Governo está a trabalhar numa solução para o fim dos descontos no imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP), recomendado pela Comissão Europeia, que não encareça os preços dos combustíveis. “Procuraremos momentos de redução dos preços, para poder reverter estes descontos”, afirmou o ministro de Estado e das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, que apresentou esta quinta-feira a proposta de Orçamento do Estado para 2026, em Lisboa. O governante apontou que esta questão é colocada pela Comissão Europeia desde 2023, tendo sido “o único reparo” que a instituição fez na avaliação do Programa Orçamental de Médio Prazo, em outubro do ano passado, e numa nova carta recebida em junho, a instar o Governo a acabar com os descontos no ISP. O ministro da Economia e da Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida, tinha já admitido "ajusta...