Orçamento do Estado previa que a inflação subisse de 1,3% em 2021 para 3,7% em 2022. Mas acabou por disparar para 7,8%. E a não atualização dos escalões do IRS beneficiou os cofres públicos, segundo o CFP
O Conselho das Finanças Públicas (CFP) estima que a decisão do Ministério das Finanças de não atualizar os limites dos escalões do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) em função da inflação no ano 2022 possa ter rendido aos cofres do Estado cerca de 523 milhões de euros.
No relatório divulgado esta quinta-feira sobre a evolução orçamental das administrações públicas em 2022, esta entidade independente dedica uma caixa a explicar o impacto desta decisão, utilizando o modelo de microssimulação Euromod.
Tendo em conta que a receita de IRS em contas nacionais em 2022 ascendeu a 16.910 milhões de euros, “estima-se ceteris paribus que o impacto da não atualização dos escalões terá variado entre 497 milhões de euros e 549 milhões de euros, com um valor central de aproximadamente 523 milhões de euros”, diz o CFP. É “o equivalente a 0,2% do PIB. Trata-se de aproximadamente um quarto do crescimento da receita de IRS no ano de 2022”.
Esta plataforma Euromod permite a simulação da implementação de reformas simples sobre os sistemas de tributação dos Estados-membros da União Europeia, particularmente sobre o IRS e sobre as contribuições para a segurança social, e desta forma obter os correspondentes impactos fiscais das reformas simuladas.
O Orçamento do Estado para 2022 previa que a taxa de inflação (IPC) subisse de 1,3% em 2021 para 3,7% em 2022.
Ora, segundo o Instituto Nacional de Estatística, em 2022, o Índice de Preços no Consumidor (IPC) acabou por registar uma variação média anual de 7,8%, significativamente acima da variação registada no conjunto do ano 2021 (1,3%). Trata-se, mesmo, da variação anual mais elevada desde 1992.
O CFP explica que o IRS incide sobre a generalidade dos rendimentos das pessoas singulares independentemente da sua categoria (trabalho, pensões, capitais e outros). Por esse motivo, os diversos rendimentos gerados numa economia tendem a ser também influenciados pelo crescimento do nível geral de preços.
“Num imposto como o IRS, a forma mais direta de mitigar o impacto da inflação no rendimento dos sujeitos passivos seria através da atualização dos limites dos escalões que o compõem, pelo valor do IPC", defende o CFP. "Relembre-se que este indicador cresceu, no ano de 2022, 7,8% face ao ano anterior. Como os limites dos escalões não foram atualizados por este percentual, simula-se, recorrendo à interface do modelo Euromod, o impacto que teria na receita uma atualização em linha com a inflação observada dos limites dos escalões no ano de 2022”.
No Orçamento do Estado para 2022, o Governo prometeu proceder a um alívio do IRS pago pelos portugueses, através da criação de dois novos escalões, de forma a aumentar o número de escalões de sete para nove e tornar este imposto mais progressivo e, assim, mais justo, melhorando o rendimento da classe média.
“Em 2022, verificar-se-á um novo desagravamento fiscal para as famílias portuguesas, concretizado através do aumento do número de escalões de IRS e diminuição das taxas médias associadas, reforçando assim a progressividade do imposto”, lê-se na proposta orçamental de abril de 2022, que acabou por aumentar o número de escalões, mas não a atualização dos valores dos escalões em função do disparo da inflação.
Foto: António Pedro Santos
Texto: Joana Nunes Mateus:
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