"Obsessão pela nacionalização, inabilidade política e má gestão" são algumas das críticas que o ex-acionista da TAP faz ao governo socialista que acusa de ter forçado a saída dos privados do capital da companhia em 2020. Neeleman garante que a TAP precisaria apenas de 300 milhões de euros e não de 3,2 mil milhões de euros para sobreviver.
David Neeleman rejeita as acusações de que o consórcio privado Atlantic Gateway, que liderava em conjunto com Humberto Pedrosa, não tenha querido salvar a TAP em 2020. O empresário americano acusa o governo de "obsessão pela nacionalização, inabilidade política e má gestão" e garante que o executivo socialista não "tinha vontade" de que o privado continuasse no capital da empresa.
"A TAP pública era a única solução que o governo admitia e tudo fez para que não houvesse outro caminho. O Estado queria recuperar o controlo da TAP e afastar os privados, a Atlantic Gateway", atesta Neeleman nas respostas escritas enviadas à Comissão Parlamentar de Inquérito à Tutela Política da Gestão da TAP (CPI) a que o Dinheiro Vivo teve acesso.
No longo documento, o ex-acionista recorda que com o eclodir da pandemia, a comissão executiva e a administração da TAP pediram ao governo "alguma dilação de prazo para pagamento de algumas obrigações tributárias, apoio temporário de tesouraria, pagamento de indemnizações que a Parpública devia à TAP e outros mecanismos legais que podiam assegurar o apoio interino necessário" mas que não obtiveram resposta.
"A administração estimou que iria precisar de um apoio imediato de entre 300 milhões e 500 milhões, mas o Estado Português decidiu desde logo que tinham de ser 3.000 milhões de euros e que tinham de entrar como capital, ou seja, ou acompanhávamos esse aumento de capital na metade que nos correspondia, ou veríamos a nossa posição de acionista diluída. Este não era um pedido sério e foi claramente hostil", refere.
O ex-acionista da TAP assegura que a TAP precisaria de apenas 300 milhões de euros e não de 3,2 mil milhões de euros, valor que acabou por ser injetado pelo Estado no âmbito do plano de reestruturação aprovado por Bruxelas.
"As estimativas da nossa equipa de gestão na altura eram de que o apoio que seria necessário era muito inferior aos EUR 3,2 mil milhões injetados. As necessidades imediatas rondavam os 300 milhões Fizemos várias propostas de utilização de mecanismos para apoio financeiro, sem necessidade de um processo de "rescue and restructure" como aconteceu e que acabou por implicar despedimentos, reduções salariais, perda de slots e todas as medidas altamente gravosas que foram exigidas aos trabalhadores", refere.
Neeleman garante que o Estado não quis negociar com os privados nem analisar as alternativas de capitalização propostas e que foi "transmitido como um facto consumado que o Estado ia capitalizar a TAP, diluindo a participação dos demais acionistas".
"A equipa de gestão da TAP identificou múltiplos mecanismos de apoio que permitiriam ao Estado apoiar a companhia, sem necessidade de intervenção de terceiros, desde logo por indemnizações e restituições que eram devidas à TAP (onde não se colocavam temas de auxílio de Estado). Nada os demoveu. A TAP pública era a única solução que o Governo admitia e tudo fez para que não houvesse outro caminho. O Estado queria recuperar o controlo da TAP e afastar os privados, a Atlantic Gateway", acusa, garantindo que o "Estado e os protagonistas da época queriam estar envolvidos na gestão operacional da empresa, queriam que o Estado tivesse controlo e não admitiam que a empresa contraísse um empréstimo com garantia do Estado, por exemplo".
Os 55 milhões de euros
O empresário americano explica que aceitou negociar a sua saída "por não haver alinhamento possível". "O Estado queira ser acionista de controlo, estar presente na gestão e esse não era o caminho que eu julgava necessário na TAP, que precisava de continuar com uma administração experiente, independente e livre para perseguir os melhores interesses da TAP, sem uma espada política e ideológica constantemente a condicionar a margem de ação da equipa de gestão", justifica.
Em 2020, o Estado pagou 55 milhões de euros a David Neeleman para recuperar a posição maioritária do capital na companhia. O empresário nega que este pagamento tenha sido uma indemnização. ". Os 55 milhões de euros referidos, foram o preço negociado e pago pelo Estado à Atlantic Gateway por uma participação no capital da TAP SGPS, precisamente porque o Governo forçou uma saída que nós não desejávamos e que nos foi imposta", esclarece.
Na resposta enviada aos deputados, Neeleman admite ainda que sem esse acordo haveria uma litígio com o Estado. "A Atlantic Gateway celebrou um Acordo Parassocial que lhe atribuía o direito a exercer uma opção de venda caso ocorressem determinados eventos. É provável que sem o acordo para a minha saída se tivesse iniciado um litígio, desde logo porque a Parpública já tinha violado o Acordo Parassocial quando impediu o IPO (oferta pública de venda) e porque tínhamos proteções contratuais caso a empresa voltasse a ser pública", adianta.
Neeleman explica que o pagamento dos 55 milhões de euros resultou de "um acordo comercial para a compra e venda" da sua participação na TAP. "Nenhuma das partes queria o litígio, portanto foi possível um acordo".
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