Agravamento dos juros e receio no consumo e investimento começam a derrubar o mercado de trabalho. Novos dados oficiais do governo (IEFP) até setembro.
O atual agravamento do número de desempregados registados nos centros de emprego públicos é o pior desde o tempo da pandemia, mas também é já o mais grave desde a crise económica e financeira, que foi marcada pelo ajustamento da troika e pela austeridade do governo de Pedro Passos Coelho (PSD), mostram cálculos do Dinheiro Vivo (DV) a partir das séries históricas compiladas pelo Banco de Portugal, baseadas nos dados do governo (IEFP).
Isto é, o desemprego registado estava, no final dos primeiros nove meses deste ano (setembro), a aumentar a um ritmo que ultrapassava já os 4%.
Sem contar com o tempo da pandemia, um período marcado por uma crise rara e atípica que não teve origem nas condições da economia (foi um choque assimétrico por causa de um novo vírus), então a atual subida homóloga acumulada do desemprego registado pelo IEFP (4,5% em setembro) é a pior desde julho de 2013, o ano do famoso "enorme aumento de impostos" do governo do primeiro-ministro Passos Coelho e do ministro das Finanças Vítor Gaspar.
Olhando apenas para os primeiros nove meses de cada ano, é necessário recuar a 2020 (aumento de 36%) e antes disso a 2012 (o primeiro ano completo da troika e da austeridade em Portugal, quando o agravamento do desemprego foi de 23% em setembro) para se encontrar uma deterioração mais severa do mercado de trabalho.
Como referido, segundo informou o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), esta segunda-feira, o número de pessoas que deram entrada nos centros de emprego como desempregadas subiu 4,5% no período de janeiro a setembro deste ano face aos mesmos nove meses do ano passado.
O fim de um ciclo
À medida que a pandemia se foi desvanecendo e os confinamentos sanitários à atividade económica e à circulação de pessoas foram desaparecendo, o desemprego foi caindo de forma notória e importante desde meados de 2021, mas pelos vistos essa fase de alívio terminou muito recentemente, no começo deste verão de 2023.
Após quase dois anos e meio de descidas, o último recuo no desemprego registado acabou por se verificar em junho passado, com menos 1,7%.
Desde aí que o fenómeno tem vindo a alastrar, refletindo já o ambiente mais hostil da subida das taxas de juro e da inflação alta, que está a travar o consumo, o investimento e que pode mesmo levar a uma queda da economia no terceiro trimestre.
A interrupção no alívio do desemprego tem importância porque o governo e o ministro das Finanças têm acenado imensas vezes com a "resiliência" do mercado de trabalho, uma das peças decisivas para resistir ao embate da subida dos juros e da inflação.
Na apresentação do OE 2024, Medina congratulou-se com a "força do mercado de trabalho", com o facto de "o emprego estar em máximos" o "desemprego baixo".
No entanto, esse tempo pode ter acabado. A subir a ritmos superiores a 4%, como é o caso, e ultrapassando já os 300 mil casos, o desemprego registado pode deixar rapidamente de ser "baixo".
Trabalhadores não qualificados dominam
Segundo o IEFP, organismo que é tutelado pela ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, "os grupos profissionais dos desempregados registados no Continente mais representativos são, por ordem decrescente: Trabalhadores não qualificados (26% do total); Trabalhadores dos serviços pessoais, de proteção segurança e vendedores (19,5%); Especialistas das atividades intelectuais e científicas" (12,3%) e Pessoal administrativo (12%)".
Razia no imobiliário e nas profissões da construção
Face ao mês homólogo de 2022 e excluindo os grupos profissionais com pouca representatividade, os maiores acréscimos no desemprego aconteceram "na maioria dos grupos, com destaque para os Operadores de instalações e máquinas e trabalhadores da montagem" (+11,1%) e o Pessoal administrativo (+9,4%)", diz o instituto.
"No que respeita à atividade económica de origem do desemprego, dos 257.883 desempregados que, no final do mês em análise, estavam inscritos como candidatos a novo emprego, nos serviços de emprego do Continente, 72,9% tinham trabalhado em atividades do setor dos Serviços, com destaque para as Atividades imobiliárias, administrativas e dos serviços de apoio (que representam 32,5%)".
Além disso, mais de 20% "eram provenientes do setor Secundário, com particular relevo para a Construção (6,2%); ao setor Agrícola pertenciam 4,3% dos desempregados".
Assim, por setor, na Agricultura, o aumento homólogo até setembro do número de desempregados foi de 1,8%) e nos outros setores já foi acima da média do País.
No setor Secundário (onde estão as indústrias), o agravamento chegou aos 8% e no Terciário (onde estão os serviços) chegou a 6,3%, segundo o IEFP.
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