Avançar para o conteúdo principal

Governo tem travado todas as soluções para comboios de longo curso

Aluguer e compra de comboios rápidos foram proibidas por Pedro Marques. No horizonte pode estar a privatização do serviço de longo curso.

O Governo só deverá autorizar a CP a comprar 22 comboios para o serviço regional, deixando de fora do caderno de encargos a aquisição de comboios idênticos aos pendulares para reforçar o longo curso.

A proposta da anterior administração da CP, liderada por Manuel Queiró, contemplava a compra de 35 comboios, dos quais dez para as relações internacionais e para “o serviço de alta qualidade nacional”. O objectivo era responder à crescente procura que se fazia sentir e preparar a CP para o impacto da liberalização do transporte ferroviário de passageiros, prevista para 2019.

Contudo, a tutela só está a preparar a aquisição de automotoras híbridas (que podem circular com tracção diesel ou eléctrica) destinadas ao serviço regional que, curiosamente, é o mais deficitário, ao passo que os comboios de longo curso, sendo mais rentáveis e geradores de maiores receitas, poderiam ajudar ao retorno global do investimento.

Não é a primeira vez que o ministério de Pedro Marques cerceia as intenções da CP em potenciar o serviço de longo de curso. Em Dezembro de 2015 a administração da empresa pretendia alugar à sua congénere Renfe comboios S-120, capazes de circular a 250 Km/hora, para reforçar a frota dos 10 pendulares que estavam a atingir o período de meia vida.

O Porto – Corunha
Em Março de 2017, no documento CP XXI, a empresa propunha que, das 35 novas composições, cinco fossem “automotoras híbridas topo de gama para o serviço internacional”. E falava em “reinventar as ligações internacionais e criar novas ligações entre o Porto e a Galiza (até La Corunha)”, antecipando a liberalização.

O governo, porém, não deu seguimento à proposta.

Um ano depois a empresa pública DB, através da Arriva, anuncia que pretende explorar a ligação Corunha - Porto utilizando para tal material alugado à Renfe (proposta que a CP já fizera em 2015) ou através da compra de novo material (proposta da CP de 2017).

Na altura o número de passageiros estava a crescer e adivinhavam-se já os problemas relacionados com a falta de material circulante que acabaram por levar à actual situação de ruptura. Mas nove meses depois, em Setembro de 2016, Pedro Marques respondia com um rotundo não e procurava até colar a intenção da CP ao governo de Passos Coelho: “o governo optou por não dar andamento à intenção do anterior executivo de privilegiar e perpetuar a solução de aluguer de material circulante”.

O governante dizia ainda que estavam a ser desenvolvidas “análises complementares para o eventual reforço da oferta”. O certo é que nada foi feito que obviasse a falta de comboios, precisamente numa altura em que o número de passageiros não parava de aumentar.

Governo afirma que cenário de privatização da CP é “fantasioso”
A CP volta à carga novamente em Março de 2017 e entrega ao Governo um documento designado CP XXI onde propõe a compra de 35 composições (das quais dez para o longo curso), num investimento global estimado em 339 milhões de euros.

O documento, de 97 páginas, a que o PÚBLICO teve acesso, fundamenta em pormenor as opções de compra, baseado em dois cenários: o da “não aquisição de automotoras” e o da “aquisição de automotoras”. O primeiro implicava continuar a pagar à Renfe 20 milhões de euros por ano por 20 unidades para serviço regional e aumentar a despesa na manutenção e na recuperação de material envelhecido. O segundo iria “produzir serviços mais competitivos e mais atractivos (melhores velocidades, maior fiabilidade, menos transbordos e melhores condições de conforto), potenciando a captação de quota de mercado e o incremento dos rendimentos de tráfego”.

O Ministério do Planeamento e das Infraestruturas, porém, não deu seguimento a esta proposta, que nunca chegaria a ser formalmente discutida entre a tutela e a CP. Esta última tentou forçar, em Junho de 2017, o lançamento do concurso público para que os novos comboios começassem a operar em finais de 2019, ainda a tempo da liberalização do transporte ferroviário de passageiros.

Mas Pedro Marques não se deixou convencer e semanas depois, em Junho de 2017, a administração de Manuel Queiró é substituída pela equipa liderada por Carlos Nogueira.

O resto da história é conhecida. Um ano depois, as dificuldades que o relatório CP XXI já antecipava e para as quais propunha soluções, levaram o transporte ferroviário ao cenário de ruptura actual.

Durante esse tempo, a CP deixou-se ficar sem opções: nem investiu na recuperação da frota (tanto a diesel como eléctrica) nem comprou novas unidades. Ao ponto do seu presidente, Carlos Nogueira, ter de anunciar no Parlamento aquilo que o seu ministro há dois anos entendia estar fora de questão: o aluguer de mais automotoras regionais à Renfe. E que entretanto, já foi confirmado pelo próprio ministro.

Por sua vez, Pedro Marques tem sublinhado ultimamente que a CP vai comprar material regional. Uma estratégia que lhe permite calar as críticas de que o Governo tem sido alvo por causa da questão ferroviária, dando a entender que já tem uma solução (que ainda por cima agrada aos autarcas).

CP está a ficar sem comboios e à beira do colapso
Linha de Cascais perdeu 137 comboios por dia em sete anos
Governo quer electrificação da Linha do Douro concluída em Março
CP vai alugar comboios a diesel em Espanha para linhas do Oeste e Algarve
Quanto aos comboios de longo curso, não é certo que venham a ser comprados, mas é certo que, entretanto, a liberalização do serviço ferroviário de passageiros terá aberto o mercado português às empresas estrangeiras, nomeadamente, à Renfe, mas também à DB (através da Arriva), à SNCF e até a operadores portugueses de que a Barraqueiro (que já é um grupo rodoviário, ferroviário e de transporte aéreo) é um exemplo.

No cenário limite, está a privatização do serviço de longo curso da CP. Uma intenção que, paradoxalmente, fazia parte do programa eleitoral das eleições de 2015 da coligação Portugal à Frente (PSD/CDS-PP) que pretendia privatizar os Alfas Pendulares e os Intercidades.

https://www.publico.pt/2018/07/29/economia/noticia/governo-tem-bloqueado-todas-as-solucoes-para-melhorar-ferrovia-1839372

Comentários

Notícias mais vistas:

Está farto de chamadas comerciais ‘spam’? Decore estas três frases ‘mágicas’ que o podem safar

 As chamadas comerciais, muitas vezes referidas como chamadas spam, são aquelas em que empresas contactam os consumidores para tentar vender produtos ou serviços. Estas chamadas tornaram-se uma das maiores fontes de irritação para os utilizadores, principalmente porque, na maioria das vezes, os produtos oferecidos não são do interesse de quem atende. Além disso, essas chamadas tendem a acontecer nos momentos mais inconvenientes, como quando acabamos de fechar os olhos para uma sesta ou enquanto estamos a pagar as compras no supermercado. Pior ainda, não se trata apenas de uma única chamada por dia; há casos em que os consumidores recebem várias dessas chamadas indesejadas em poucas horas, o que aumenta o nível de frustração. Com o crescimento da cibercriminalidade, as chamadas telefónicas tornaram-se também uma via popular para fraudes, o que faz com que os consumidores queiram eliminar este tipo de contactos para evitar confusões entre chamadas legítimas e tentativas de burla. Ape...

Os professores

 As últimas semanas têm sido agitadas nas escolas do ensino público, fruto das diversas greves desencadeadas por uma percentagem bastante elevada da classe de docentes. Várias têm sido as causas da contestação, nomeadamente o congelamento do tempo de serviço, o sistema de quotas para progressão na carreira e a baixa remuneração, mas há uma que é particularmente grave e sintomática da descredibilização do ensino pelo qual o Estado é o primeiro responsável, e que tem a ver com a gradual falta de autoridade dos professores. A minha geração cresceu a ter no professor uma referência, respeitando-o e temendo-o, consciente de que os nossos deslizes, tanto ao nível do estudo como do comportamento, teriam consequências bem gravosas na nossa progressão nos anos escolares. Hoje, os alunos, numa maioria demasiado considerável, não evidenciam qualquer tipo de respeito e deferência pelo seu professor e não acatam a sua autoridade, enfrentando-o sem nenhum receio. Esta realidade é uma das princip...

Armazenamento holográfico

 Esta técnica de armazenamento de alta capacidade pode ser uma das respostas para a crescente produção de dados a nível mundial Quando pensa em hologramas provavelmente associa o conceito a uma forma futurista de comunicação e que irá permitir uma maior proximidade entre pessoas através da internet. Mas o conceito de holograma (que na prática é uma técnica de registo de padrões de interferência de luz) permite que seja explorado noutros segmentos, como o do armazenamento de dados de alta capacidade. A ideia de criar unidades de armazenamento holográficas não é nova – o conceito surgiu na década de 1960 –, mas está a ganhar nova vida graças aos avanços tecnológicos feitos em áreas como os sensores de imagem, lasers e algoritmos de Inteligência Artificial. Como se guardam dados num holograma? Primeiro, a informação que queremos preservar é codificada numa imagem 2D. Depois, é emitido um raio laser que é passado por um divisor, que cria um feixe de referência (no seu estado original) ...