Fenómeno de ‘ghosting’ está a crescer nos EUA, com muitos trabalhadores a abandonarem a empresa sem uma palavra ou desistindo a meio de um processo de recrutamento.
Num dia, tudo está bem, e o director de Recursos Humanos de uma empresa está perto de fechar a contratação de vários funcionários, depois de entrevistas e de várias fases do recrutamento. De repente, os candidatos não voltam para completar o processo. Mais, não dizem mais nada e nem sequer atendem o telefone do seu possível futuro empregador. Tornaram-se, de um momento para o outro, em fantasmas laborais.
O fenómeno é retratado num artigo recente da equipa editorial do Linkedin, com ênfase nos EUA, onde a situação está a alastrar. É que o chamado ‘ghosting’ não está só a acontecer com trabalhadores ainda não contratados; há funcionários que simplesmente se levantam e nunca mais aparecem.
Há várias teorias que podem justificar o aumento destes comportamentos. Por um lado, os EUA estão em pleno emprego e com bom crescimento económico. Há mais vagas por preencher do que trabalhadores – sobretudo qualificados – para ocupar esses lugares. Isto nunca tinha acontecido desde que o Departamento norte-americano do Trabalho começou a recolher estes dados, há 18 anos. O que isto provoca é que a relação de forças se desequilibrou, de forma atípica, em favor dos trabalhadores, e em detrimento das empresas, que habitualmente têm todo o poder.
Com tamanha procura e abundância de oportunidades de trabalho, há muitos anos que não era tão fácil mudar de emprego nos EUA, que têm regras muito flexíveis na quebra de vínculos laborais. Segundo o mesmo artigo, em Março, o número de saídas de funcionários das empresas norte-americanas bateu um novo recorde, sendo que dois terços dessas saídas foram por iniciativa do trabalhador.
Esta vitalidade do mercado de trabalho não tem nada de errado, até porque surge depois de décadas em que os funcionários não tinham muitas vezes a hipótese de escolher entre vários empregos. O problema é a forma como estas saídas se estão a dar, de forma abrupta, sem explicações, e muitas vezes sem uma simples informação. E, na hora de ir recrutar, o problema é o mesmo. As empresas têm agora de lutar pelos trabalhadores e mesmo que o encontro de vontades esteja bem encaminhado, isso não é garantia nenhuma. Há candidatos que desaparecem depois de várias conversas, e outros que até terminam o processo com sucesso e depois pura e simplesmente não aparecem.
O trabalho do Linkedin dá algumas pistas sobre este comportamento. Por um lado, há uma nova geração no mercado de trabalho, habituada a comunicar através das redes sociais ou de mensagens, e que não têm as competências de comunicação humana que lhes permita perceber que é falta de educação simplesmente tornar-se fantasmas. Mais, são jovens adultos que não querem lidar com o confronto, a desilusão e a frustração que eventualmente os espera quando dizem a um recrutador que, afinal, não querem trabalhar para aquela empresa. Perante a situação, muitos desaparecem e não se deixam contactar.
Seja qual for a razão, este fenómeno não é isento de penalizações para quem o pratica. Não são só os candidatos a um emprego que escolhem outra empresa, os próprios responsáveis de Recursos Humanos também mudam de companhia. E dificilmente darão uma oportunidade, em qualquer empresa, a alguém que já lhes tenha pregado a partida do fantasma.
O ‘ghosting’ é um termo que, nos EUA, já era aplicado no mundo do namoro e das relações amorosas. Segundo Amanda Bradford, CEO e fundadora do The League, uma app de encontros, o ‘ghosting’ “tornou-se quase uma nova linguagem, em que uma não resposta é uma resposta”. Ou seja, para não magoar ou desapontar um pretendente, a outra pessoa deixa, pura e simplesmente de responder, partindo do princípio de que a sua posição fica, assim, clara. Para uma geração para quem é habitual conhecer parceiros amorosos em plataformas como o Tinder, este comportamento é visto como normal. E Bradford está a sentir o mesmo enquanto empregadora, ao procurar engenheiros para trabalhar na sua empresa. O que se passava no mundo dos encontros, “está agora a acontecer no mercado de trabalho”, reconhece.
As dificuldades dos recrutadores são tais que muitos estão a trabalhar em regime de ‘overbooking’: tentam seduzir muito mais trabalhadores dos que as vagas que têm disponíveis, porque sabem que vários vão desaparecer ao longo do processo.
Estes problemas não são totalmente novos. No início do século, antes do rebentamento da bolha das dotcom, foi possível detectar alguns destes comportamentos, num momento em que o mercado de trabalho estava também escasso de candidatos e abundante em oferta.
E se as empresas se queixam agora, a verdade é que muitas estão apenas a receber dos trabalhadores o mesmo tratamento que lhes destinaram, durante décadas. A frustração de mandar currículos e não receber uma única resposta, não conseguir falar com os Recursos Humanos de uma instituição onde se quer trabalhar, tudo isso é visto como habitual. Agora, as coisas estão ao contrário. E as empresas têm de se adaptar.
http://visao.sapo.pt/exame/2018-06-27-Conhece-os-fantasmas-no-mundo-do-trabalho-
Num dia, tudo está bem, e o director de Recursos Humanos de uma empresa está perto de fechar a contratação de vários funcionários, depois de entrevistas e de várias fases do recrutamento. De repente, os candidatos não voltam para completar o processo. Mais, não dizem mais nada e nem sequer atendem o telefone do seu possível futuro empregador. Tornaram-se, de um momento para o outro, em fantasmas laborais.
O fenómeno é retratado num artigo recente da equipa editorial do Linkedin, com ênfase nos EUA, onde a situação está a alastrar. É que o chamado ‘ghosting’ não está só a acontecer com trabalhadores ainda não contratados; há funcionários que simplesmente se levantam e nunca mais aparecem.
Há várias teorias que podem justificar o aumento destes comportamentos. Por um lado, os EUA estão em pleno emprego e com bom crescimento económico. Há mais vagas por preencher do que trabalhadores – sobretudo qualificados – para ocupar esses lugares. Isto nunca tinha acontecido desde que o Departamento norte-americano do Trabalho começou a recolher estes dados, há 18 anos. O que isto provoca é que a relação de forças se desequilibrou, de forma atípica, em favor dos trabalhadores, e em detrimento das empresas, que habitualmente têm todo o poder.
Com tamanha procura e abundância de oportunidades de trabalho, há muitos anos que não era tão fácil mudar de emprego nos EUA, que têm regras muito flexíveis na quebra de vínculos laborais. Segundo o mesmo artigo, em Março, o número de saídas de funcionários das empresas norte-americanas bateu um novo recorde, sendo que dois terços dessas saídas foram por iniciativa do trabalhador.
Esta vitalidade do mercado de trabalho não tem nada de errado, até porque surge depois de décadas em que os funcionários não tinham muitas vezes a hipótese de escolher entre vários empregos. O problema é a forma como estas saídas se estão a dar, de forma abrupta, sem explicações, e muitas vezes sem uma simples informação. E, na hora de ir recrutar, o problema é o mesmo. As empresas têm agora de lutar pelos trabalhadores e mesmo que o encontro de vontades esteja bem encaminhado, isso não é garantia nenhuma. Há candidatos que desaparecem depois de várias conversas, e outros que até terminam o processo com sucesso e depois pura e simplesmente não aparecem.
O trabalho do Linkedin dá algumas pistas sobre este comportamento. Por um lado, há uma nova geração no mercado de trabalho, habituada a comunicar através das redes sociais ou de mensagens, e que não têm as competências de comunicação humana que lhes permita perceber que é falta de educação simplesmente tornar-se fantasmas. Mais, são jovens adultos que não querem lidar com o confronto, a desilusão e a frustração que eventualmente os espera quando dizem a um recrutador que, afinal, não querem trabalhar para aquela empresa. Perante a situação, muitos desaparecem e não se deixam contactar.
Seja qual for a razão, este fenómeno não é isento de penalizações para quem o pratica. Não são só os candidatos a um emprego que escolhem outra empresa, os próprios responsáveis de Recursos Humanos também mudam de companhia. E dificilmente darão uma oportunidade, em qualquer empresa, a alguém que já lhes tenha pregado a partida do fantasma.
O ‘ghosting’ é um termo que, nos EUA, já era aplicado no mundo do namoro e das relações amorosas. Segundo Amanda Bradford, CEO e fundadora do The League, uma app de encontros, o ‘ghosting’ “tornou-se quase uma nova linguagem, em que uma não resposta é uma resposta”. Ou seja, para não magoar ou desapontar um pretendente, a outra pessoa deixa, pura e simplesmente de responder, partindo do princípio de que a sua posição fica, assim, clara. Para uma geração para quem é habitual conhecer parceiros amorosos em plataformas como o Tinder, este comportamento é visto como normal. E Bradford está a sentir o mesmo enquanto empregadora, ao procurar engenheiros para trabalhar na sua empresa. O que se passava no mundo dos encontros, “está agora a acontecer no mercado de trabalho”, reconhece.
As dificuldades dos recrutadores são tais que muitos estão a trabalhar em regime de ‘overbooking’: tentam seduzir muito mais trabalhadores dos que as vagas que têm disponíveis, porque sabem que vários vão desaparecer ao longo do processo.
Estes problemas não são totalmente novos. No início do século, antes do rebentamento da bolha das dotcom, foi possível detectar alguns destes comportamentos, num momento em que o mercado de trabalho estava também escasso de candidatos e abundante em oferta.
E se as empresas se queixam agora, a verdade é que muitas estão apenas a receber dos trabalhadores o mesmo tratamento que lhes destinaram, durante décadas. A frustração de mandar currículos e não receber uma única resposta, não conseguir falar com os Recursos Humanos de uma instituição onde se quer trabalhar, tudo isso é visto como habitual. Agora, as coisas estão ao contrário. E as empresas têm de se adaptar.
http://visao.sapo.pt/exame/2018-06-27-Conhece-os-fantasmas-no-mundo-do-trabalho-
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