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Exportações de bicicletas estão a cair, mas Portugal mantém-se como maior produtor europeu



 Na pandemia, toda a gente queria bicicletas e não as havia. Agora, faltam compradores para tanta bicicleta no mercado. Na Alemanha vendem-se modelos elétricos com 60% de desconto. Já há falências e despedimentos. Em Portugal, as exportações, no acumulado do ano até outubro, estão 1,67% abaixo do ano passado.


Depois do “boom enorme” da pandemia, o mercado das bicicletas arrefeceu em 2023 e assim se mantém. A expectativa generalizada era que o setor recuperasse este ano, mas a instabilidade dos mercados, a crise inflacionista e a necessidade de escoar stocks está a fazer com que a retoma tarde. Apesar de tudo, Portugal mantém-se como o maior produtor europeu de bicicletas e tem todas as condições para tirar partido da revolução esperada da mobilidade suave.


O melhor ano de sempre da fileira foi o de 2022, quando Portugal exportou bicicletas e componentes no valor de 772,2 milhões de euros. Quase o dobro do verificado em 2019. O problema é que, com a covid, a procura disparou, mas a dificuldade de abastecimento, com as cadeias logísticas completamente desreguladas, levou os fabricantes a procurarem abastecer-se de componentes para fazer face a encomendas a dois anos... mas o mercado arrefeceu e as fábricas ficaram com os armazéns cheios um pouco por toda a Europa. 2023 foi ano de limpeza de stocks, mas também de despedimentos e falências.


Os dados da confederação europeia do setor, a Conebi, mostram que as vendas de bicicletas no espaço europeu recuaram 8,9% em 2023 e que a produção e as exportações caíram quase 20%. Os empregos na fileira europeia encolheram em 5,5%. 


Basta ter em conta que, em 2020, a União Europeia produziu 12,2 milhões de bicicletas, mais 1,2% do que no ano anterior. Portugal contribuiu, então, com 2,6 milhões de unidades. Em 2023, foram feitas 9,7 milhões de bicicletas no espaço europeu - uma quebra de 24%-, destas, 1,8 milhões foram feitas nas fábricas portuguesas, de acordo com os dados do Eurostat. Já as exportações nacionais caíram 1,58% e ficaram-se pelos 760 milhões de euros.


2024 prometia ser o ano de recuperação, tendo arrancado com um janeiro “muito forte”, o “melhor janeiro de sempre”, diz o secretário geral da Associação Nacional das Indústrias das Duas Rodas (Abimota). Gil Nadais fala em números “muito contraditórios” e admite que, mesmo com dez meses já contabilizados, ainda não é possível estimar se o ano fecha em terreno positivo ou não. 


É que depois de janeiro, em que as exportações de bicicletas elétricas dispararam 33% para quase 20 milhões de euros e as não-elétricas cresceram 19% e chegaram praticamente aos 32 milhões de euros, os meses seguintes foram de quebras. Entre fevereiro e junho, a fileira exportou bens no valor de 308,8 milhões, quase 53 milhões de euros a menos do que no período homólogo. 


Verão em alta

O verão trouxe, de novo, o crescimento nas vendas ao exterior. Só entre julho e outubro, as exportações de bicicletas e de componentes cresceram 15,7% para um valor total de 277,7 milhões de euros. Julho e outubro foram os melhores meses do ano, com crescimentos homólogos de 23,5% em cada um destes meses. Agosto cresceu 10,2% e só setembro foi mais comedido: um acréscimo de 0,9%.


Mas, no acumulado de janeiro a outubro, a fileira está ainda em terreno negativo, com uma quebra total de 1,67% para 647,7 milhões de euros exportados. O segmento de bicicletas não elétricas corresponde a quase metade deste valor: são 319,6 milhões de euros, mais 12% do que em igual período de 2023.


Já as bicicletas elétricas estão a cair 13,9% e ficaram-se pelos 211,3 milhões de euros. Os componentes também estão no vermelho: vendemos ao exterior componentes diversos para a indústria das duas rodas no valor de 116,7 milhões de euros, 8,8% a menos do que entre janeiro e outubro de 2023. 

“Outubro foi um mês em que registámos, de facto, um crescimento muito significativo, mas não posso extrapolar, nem posso garantir que assim continue”, diz Gil Nadais, assumindo que as fábricas têm comportamentos diversos. “Tanto há quem esteja a vender mais como quem esteja a vender menos, vamos ter que esperar mesmo até estarem encerrados os dados do ano, para sabermos como ficamos”, afirma.


No entanto, o secretário-geral da Abimota mostra-se confiante no futuro. “As perspetivas para o setor continuam a ser boas, porque esta tendência da mobilidade suave vai continuar a crescer”, garante, assumindo-se “confiante” no desenvolvimento futuro do cluster. No entanto, não arrisca previsões já para 2025. “Vivemos uma época de muita incerteza, a instabilidade no mundo é grande, temos duas guerras à porta, temos a questão da inflação, uma nova presidência nos Estados Unidos, tudo isso traz apreensões ao setor”, admite Gil Nadais. Por outro lado, lembra que “todos os estudos dizem que a mobilidade nas cidades está a mudar”, portanto, há que ter confiança que “2025 vai ser um ano positivo”. 


PRR em marcha com execução próxima dos 60%

Determinante para que a fileira reforce a sua posição de liderança na Europa é a AM2R, a agenda mobilizadora para a Inovação Empresarial do Setor das Duas Rodas, que tem já uma taxa de execução muito próxima dos 60%. A AM2R que pretende transformar o perfil produtivo do setor, aumentar a sua competitividade e assegurar a independência do mercado português face ao asiático, promovendo a criação de uma bicicleta 100% portuguesa.


Envolve 42 entidades, das quais 34 empresas. Gil Nadais explica que houve quatro empresas que desistiram, levando a uma reafetação das verbas, mas que, globalmente, o investimento vai ser ainda maior e o número de produtos novos a lançar também será maior. O investimento do projeto, ao abrigo do PRR, passou assim de 213,7 milhões para 228,5 milhões de euros. E o setor continua a gerar grande interesse por parte de investidores estrangeiros. Em análise estão vários projetos de expansão de unidades existentes, garante, sem referir entidades envolvidas. 


Novos investidores

Há também novos investidores. É o caso da Bikap - Bike Assembly Portugal, na Anadia, que, como o nome indica, é uma empresa de assemblagem de bicicletas elétricas e convencionais, estando também preparada para fazer trotinetas e triciclos. Criada em agosto de 2021, a Bikap conta com uma equipa de 20 pessoas e clientes em Espanha, França, Bélgica, Reino Unido, Alemanha, Holanda, Portugal e China. Exporta 99% do que faz. Rita Ferreira, uma das sócios fundadoras da Bikap, reconhece que 2024 foi um “ano difícil para todo o setor a nível mundial”.


Não admira por isso que, em mercados como a Alemanha, Suíça ou Países Baixos, tenha sido possível, este ano, comprar bicicletas elétricas com 50% e 60% de desconto. 

Na Bikap, o segundo semestre de 2024 foi “o melhor de sempre”, com “várias encomendas fechadas e vários clientes novos”, e a expectativa é que o próximo semestre seja “certamente” melhor que este. “Estamos otimistas, já se começa a sentir a recuperação”, diz Rita Ferreira, que lamenta a falta de incentivo ao uso da bicicleta em Portugal. “Somos o maior produtor, mas não somos o maior utilizador, o que é um contrassenso”, sublinha esta responsável, que gostaria de ver as próprias empresas a promoverem o uso de bicicletas junto dos seus trabalhadores, e os municípios a concederem benefícios fiscais a quem o fizesse. As autarquias têm, também, de investir mais nas ligações em ciclovias às escolas e às grandes empresas, defende. 


Já na AJMaias, empresa da Malaposta que dá emprego a 220 pessoas e trabalha em exclusivo para a Decathlon, em mercados como Portugal, Espanha, França e Itália, o ano foi “tranquilo”. Luís Santiago, administrador da empresa, estima que a faturação de 2024 deva ficar pelos 11 a 12 milhões de euros, versus os 15 milhões de 2023. E para 2025 está a apontar para valores em linha com os de este ano. “A incerteza é muita, ninguém tem uma bola de cristal, não sabemos como vai evoluir a crise na Europa, em especial em França e na Alemanha, dois mercados que influenciam muito as vendas totais do setor”, admite.


A AJMaias é uma das 34 empresas envolvidas na agenda mobilizadora do setor das duas rodas. Investiu, nesse âmbito, na produção de raios e no fabrico automático de aros para bicicletas, mas o projeto para a produção automática de forquetas foi suspenso. O investimento tem de ser “muito controlado”, admite Luís Santiago.


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