Avançar para o conteúdo principal

Semana de 12 horas de trabalho.

Venezuela. Semana de 12 horas para poupar eletricidade

Funcionários públicos só vão trabalhar às segundas e terças. Governo culpa a seca. Oposição aponta o dedo a Maduro

Escolas vão fechar às sextas-feiras para economizar energia.
Apagão de 4 horas todos os dias para poupar electricidade, num país tropical onde os congelados descongelam a maior velocidade.

Primeiro o presidente venezuelano ordenou que os centros comerciais reduzissem o horário de funcionamento, depois Nicolás Maduro decretou que se adiantassem meia hora os relógios. Em seguida vieram os cortes de luz diários de quatro horas. No início do mês, a maioria dos 2,8 milhões funcionários públicos soube que ia deixar de trabalhar às sextas-feiras em abril e maio. Agora, foram informados que só vão trabalhar às segundas e às terças-feiras, entre as 7.00 e as 13.00. Para a oposição, a culpa de ser preciso reduzir o consumo da eletricidade não é só do El Niño.

A seca provocada pelo fenómeno climático que resulta do aquecimento das águas do Pacífico deixou as reservas da central hidroelétrica de Guri (responsável pelo abastecimento de 70% do país) a níveis críticos. Segundo Maduro, as medidas já tomadas permitem baixar a diminuição do nível de água dos 22 para os dez centímetros por dia.

Mas a oposição diz que a crise energética é produto da "má gestão, falta de manutenção" no setor e "corrupção" do governo, que não investiu o suficiente para fazer face a estes problemas e para diversificar as fontes de energia. Além disso, alega que a ideia de dar folga aos trabalhadores não vai resultar numa poupança de eletricidade e apenas será prejudicial à produtividade. Tudo porque, entre 40% e 60% do consumo elétrico no país é doméstico, de acordo com números citados pela BBC.

Venezuelanos protestam nas ruas contra racionamento de eletricidade

A Venezuela, que tem as maiores reservas de petróleo do mundo, está dependente do ouro negro, cujo preço por barril ronda os 45 dólares (chegou a estar a 120 dólares). As exportações de petróleo garantem 96% das receitas do país. Sem dinheiro, Caracas não consegue comprar os produtos de primeira necessidade, que estão em falta nas prateleiras dos supermercados. Os venezuelanos são obrigados a fazer filas para poderem comprar o que vai aparecendo. A inflação, a pior do mundo, foi de 180% em 2015.

"Não se trabalha às quartas, quintas e sextas no setor público, exceto naquelas tarefas que são fundamentais e necessárias, e às sextas-feiras também não haverá aulas nos níveis inicial, médio e básico", anunciou o vice-presidente, Aristóbulo Istúriz. Na prática, só se trabalhará das 7.00 às 13.00 às segundas e terças, ou seja, 12 horas por semana, pelo menos durante 15 dias. Tudo sem perder os ordenados. É "uma medida necessária", explicou o presidente, "enquanto passamos estas semanas críticas, extremas, onde estamos a fazer tudo, tudo, tudo para salvar o Guri", acrescentou.

Venezuelanos vão ficar sem eletricidade quatro horas diárias durante 40 dias

Críticas

O governador do estado de Miranda, Henrique Capriles (derrotado nas presidenciais de 2013), convocou uma megamanifestação para o próximo domingo, Dia do Trabalhador, para protestar "contra a escassez, contra a crise económica, contra os apagões, contra a inflação, contra o desastre que estamos a viver os venezuelanos".

"Maduro nunca gostou de trabalhar, se fosse por ele, decretava que não se trabalhava até dezembro, mas neste caso para evitar o revogatório", escreveu Capriles no Twitter, referindo-se ao facto de a oposição ter em marcha a recolha de assinaturas para um referendo que poderá resultar no afastamento de Maduro. O hashtag #YoFirmoYoRevoco (eu assino, eu revogo) era o mais usado ontem nesta rede social na Venezuela, sendo acompanhada de fotos de filas de pessoas à espera para poderem assinar.

"Na Assembleia Nacional trabalharemos de segunda a sexta. O decreto de vadiagem ditado pelo regime não nos paralisará", disse também no Twitter o presidente do Parlamento Henry Ramos Allup, repetindo a ideia de que esta é uma manobra do governo para evitar o referendo. A oposição está desde ontem a recolher assinaturas (precisa, num primeiro momento, de quase 200 mil) que têm que ser confirmadas, uma a uma, pelas instâncias eleitorais no prazo de 25 dias.

PERGUNTA E RESPOSTA

O presidente Nicolas Maduro não tinha perdido as eleições?

› A oposição venezuelana venceu as eleições legislativas de 6 de dezembro, conseguindo eleger mais de dois terços dos deputados da Assembleia Nacional, mas não as eleições presidenciais. Maduro está ainda a meio do mandato.

Como é que está a ser a relação de Maduro com a Assembleia Nacional?

› Má. Maduro tem governado por decreto presidencial (foi assim que cortou a semana de trabalho para dois dias), com a Assembleia Nacional a conseguir travar algumas das suas medidas - como o Plano de Emergência Económica, vetado em janeiro. Já os deputados tentam aplicar algumas leis, como a amnistia aos presos políticos, que acabam por não passar no Supremo Tribunal de Justiça (considerado próximo do chavismo).

A oposição quer afastar Maduro. Pode fazê-lo?

› A Constituição venezuelana prevê que, a partir de metade do mandato de qualquer cargo eleito, possa ser convocado um referendo revocatório. É nesse sentido que está a trabalhar a oposição. O Conselho Nacional Eleitoral demorou a entregar os documentos para permitir a recolha de assinaturas, mas o processo acabou por ser desbloqueado ontem.

O que é preciso para revogar o presidente?

› Primeiro a oposição tem cinco dias para recolher 1% das assinaturas dos eleitores - pouco menos de 200 mil - que têm que ser confirmadas pelo tribunal eleitoral. Depois, tem três dias para recolher as assinaturas de 20% dos eleitores (quase quatro milhões). Só com tudo confirmado pode ser convocado um referendo revogatório, no qual têm que votar mais de cinco milhões de eleitores. Para afastar o presidente, a oposição tem que conseguir pelo menos mais um voto do que os 7 587 579 com que Maduro foi eleito em 2013. Se a decisão for ainda este ano, convocam-se novas eleições. Se já faltarem menos de dois anos para o fim do mandato, o vice-presidente Aristóbulo Istúriz assume o poder.


Em: http://www.dn.pt/mundo/interior/venezuela-semana-de-12-horas-para-poupar-eletricidade-5146860.html

Comentários

Notícias mais vistas:

EUA criticam prisão domiciliária de Bolsonaro e ameaçam responsabilizar envolvidos

 Numa ação imediatamente condenada pelos Estados Unidos, um juiz do Supremo Tribunal do Brasil ordenou a prisão domiciliária de Jair Bolsonaro por violação das "medidas preventivas" impostas antes do seu julgamento por uma alegada tentativa de golpe de Estado. Os EUA afirmam que o juiz está a tentar "silenciar a oposição", uma vez que o ex-presidente é acusado de violar a proibição imposta por receios de que possa fugir antes de se sentar no banco dos réus. Numa nota divulgada nas redes sociais, o Escritório para Assuntos do Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado dos Estados Unidos recorda que, apesar do juiz Alexandre de Morais "já ter sido sancionado pelos Estados Unidos por violações de direitos humanos, continua a usar as instituições brasileiras para silenciar a oposição e ameaçar a democracia". Os Estados Unidos consideram que "impor ainda mais restrições à capacidade de Jair Bolsonaro de se defender publicamente não é um serviço público...

Supercarregadores portugueses surpreendem mercado com 600 kW e mais tecnologia

 Uma jovem empresa portuguesa surpreendeu o mercado mundial de carregadores rápidos para veículos eléctricos. De uma assentada, oferece potência nunca vista, até 600 kW, e tecnologias inovadoras. O nome i-charging pode não dizer nada a muita gente, mas no mundo dos carregadores rápidos para veículos eléctricos, esta jovem empresa portuguesa é a nova referência do sector. Nasceu somente em 2019, mas isso não a impede de já ter lançado no mercado em Março uma gama completa de sistemas de recarga para veículos eléctricos em corrente alterna (AC), de baixa potência, e de ter apresentado agora uma família de carregadores em corrente contínua (DC) para carga rápida com as potências mais elevadas do mercado. Há cerca de 20 fabricantes na Europa de carregadores rápidos, pelo que a estratégia para nos impormos passou por oferecermos um produto disruptivo e que se diferenciasse dos restantes, não pelo preço, mas pelo conteúdo”, explicou ao Observador Pedro Moreira da Silva, CEO da i-charging...

Aníbal Cavaco Silva

Diogo agostinho  Num país que está sem rumo, sem visão e sem estratégia, é bom recordar quem já teve essa capacidade aliada a outra, que não se consegue adquirir, a liderança. Com uma pandemia às costas, e um país político-mediático entretido a debater linhas vermelhas, o que vemos são medidas sem grande coerência e um rumo nada perceptível. No meio do caos, importa relembrar Aníbal Cavaco Silva. O político mais bem-sucedido eleitoralmente no Portugal democrático. Quatro vezes com mais de 50% dos votos, em tempos de poucas preocupações com a abstenção, deve querer dizer algo, apesar de hoje não ser muito popular elogiar Cavaco Silva. Penso que é, sem dúvida, um dos grandes nomes da nossa Democracia. Nem sempre concordei com tudo. É assim a vida, é quase impossível fazer tudo bem. Penso que tem responsabilidade na ascensão de António Guterres e José Sócrates ao cargo de Primeiro-Ministro, com enormes prejuízos económicos, financeiros e políticos para o país. Mas isso são outras ques...